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segunda-feira, 5 de outubro de 2009

“Fichas sujas”

O (excelente) site Congresso em Foco diz que os deputados já “começaram a reagir ao projeto de lei que exige “ficha limpa” dos candidatos”, entregue dia 29 a Michel Temer, presidente da Câmara pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). “Em nome do consenso, parlamentares defendem a derrubada do dispositivo que torna inelegíveis políticos condenados em primeira ou única instância ou que tiveram denúncia recebida por órgão judicial colegiado”, diz o site. Diz a jornalista Renata Camargo que “o projeto, entre outras mudanças, proíbe que seja registrada a candidatura de pessoas condenadas em primeira instância por crimes como racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas, por compra de votos ou uso eleitoral da máquina administrativa; assim como de parlamentares que tenham renunciado ao mandato para fugir de cassações ou que respondem a denúncias recebidas pelos tribunais superiores do Poder Judiciário”. Porventura aprovado, o projeto transformado em lei ia repercutir no Brasil inteiro, onde não existe um único Estado sem político com culpa no cartório. No Pará, a tsunami moralista envolveria sete deputados e dois senadores, conforme levantamento do Congresso em Foco. Veja a lista: Deputados Asdrúbal Bentes (PMDB-PA) – Ação Penal 481 – estelionato, captação ilícita de votos e formação de quadrilha ou bando. É resultado do Inquérito 2197, que em março de 2005, foi instaurado para apurar a troca de votos por laqueaduras de trompas – Redistribuído em 15/09/2009 Jader Barbalho (PMDB-PA) – Ação Penal 336 – emprego irregular de verbas ou rendas públicas Ação Penal 339 – crimes contra o sistema financeiro nacional. Ação Penal 397 – estelionato, formação de quadrilha, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro. Ação Penal 498 – peculato; Ação Penal 398 – peculato. Corre em segredo de Justiça. Ação Penal 374 – emprego irregular de verbas ou rendas públicas. Inquérito 2051 – crimes praticados por funcionários públicos contra a administração em geral. Corre em segredo de Justiça. Inquérito 2760 – formação de quadrilha, crime contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro. Corre em segredo de Justiça. Inquérito 1332 – crime contra a administração pública Lira Maia (DEM-PA) Ação Penal 484 – crime de responsabilidade durante gestão em prefeitura. Inquérito 2578 – crime de responsabilidade, durante mandato como prefeito. Ação Penal 517 – crime de responsabilidade, durante mandato de prefeito. Ação Penal 518 – crime de responsabilidade, durante mandato de prefeito. Inquérito 2742 – crime de responsabilidade, durante mandato como prefeito. Paulo Rocha (PT-PA) Ação Penal 470 (mensalão) – por formação de quadrilha ou bando, crimes contra a administração pública em geral, crime de lavagem ou ocultação de bens, direitos ou valores Wladimir Costa (PMDB-PA) Ação Penal 415 – crimes de imprensa/ crimes contra a honra. Ação penal 474 – crimes de imprensa/ crimes contra a honra. Inquérito 2312 – não tem a natureza informada e corre em sigilo. Senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA) Inquérito 2266 – sem assunto especificado. Corre em segredo de justiça Mário Couto (PSDB-PA) Ação Penal 440 – crime eleitoral/ Desobediência às determinações da Justiça Eleitoral. Inquérito 2539 – desobediência às determinações da Justiça Eleitoral.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Dr. Ademir, por favor, queira traduzir para nós, leigos, o que significa o termo "Corre em segredo de Justiça". Em 06.10.09, Marabá-PA.

Ademir Braz disse...

Caro: o colunista do Segunda Leitura, Vladimir Passos de Freitas, tem uma definição que me parece a mais completa sobre o assunto. Leia aí:
"O segredo de Justiça consiste em manter sob sigilo processos judiciais ou investigações policiais, que normalmente são públicos, por força de lei ou de decisão judicial. Assim, em determinadas situações, o interesse de possibilitar informações a todos cede diante de um interesse público maior ou privado, em hipóteses excepcionais. No Brasil, há previsão nos artigos. 5º, XII, XIV e XXXIII; 93, X; e 136, parágrafo 1º, I, “b” e “c” da Constituição Federal; artigo 325 do Código Penal; artigo 20 do Código de Processo Penal; artigo 10 da Lei 9.296/96; artigo 11 da Lei Complementar 10.300/01; e artigo 155 do Código de Processo Civil, além de dispositivos em leis esparsas (p. ex., art. 1º, § 6º, da Lei 4.717 76).

O tema tem várias faces. De um lado, à unanimidade, todos concordam que as questões de Estado devem tramitar sigilosamente (por exemplo, direito de família). De outro, o sigilo nas investigações policiais desperta grandes polêmicas. No meio, sem que ninguém aponte um caminho, ficam temas pouco estudados, mas não menos importantes (por exemplo, publicidade dos processos disciplinares contra magistrados, Lei Complementar 69, artigo 54). Vejamos a realidade forense.

a) Investigações policiais: busca a Polícia Judiciária colher provas, regra geral em Inquérito Policial, sem a interferência da defesa (CP, art. 20), vez que nesta fase ainda não há o contraditório. Os advogados criminalistas, ao contrário, reivindicam o direito de acesso aos IPs, como assegura o artigo 7º, XIV, da Lei 8.096/94. O STF deu boa solução, assegurando ao advogado o direito de obter informações já introduzidas nos autos, mas não as que se referem a diligências em curso (HC 82.354/PR, Rel. Sepúlveda Pertence). É dizer, tem direito de saber o que há, mas não o que haverá;

b) Ações penais em geral: processos criminais são, regra geral, públicos e o sigilo só se justifica se houver ofensa que exponha a vítima a situação constrangedora (por exemplo, em caso de estupro com violência);

c) Ações penais originárias: as ações penais propostas contra autoridades com direito a foro privilegiado, nos tribunais recebem, regra geral, segredo de Justiça, com base no artigo 54 da Loman. Todavia, o artigo 93, X, da Constituição Federal, afirma que as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública. Na praxe forense tem se mantido o sigilo, mas a publicidade prevista na Carta Magna, ao meu juízo, deve prevalecer sobre o sigilo da Loman.

d) Legislação civil: as ações de Estado são sigilosas (art. 155, II, do CPC). Mas o que é o interesse público previsto no inciso I? Na minha opinião, é aquele que se sobrepõe ao do particular, que afeta a comunidade como um todo. Por exemplo, há interesse público em uma ação que discuta a localização de antenas eletromagnéticas, cujos efeitos são desconhecidos.

Aí estão as previsões. Nem por isso as soluções são simples. O artigo 10, da Lei 9.296/96, afirma ser crime quebrar segredo da Justiça sem autorização judicial. Mas como garantir o sigilo, se o processo passa pela Polícia, Vara, MP e advogado? No sistema atual não existem regras sobre a tramitação e qualquer dos atores ou servidores pode passar à frente informações, por corrupção, vaidade, amizade ou outro sentimento. E a jurisprudência não registra condenações."
Tomara que isto o satisfaça. Pra mim, segredo de Justiça e reuniões secretas de vereadores, deputados e senadores no gabinete da presidência desses poderes são uma afronta ao dever constitucional de transparência no poder público.