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sexta-feira, 18 de maio de 2007

A arte em grãos - V: Ronaldo Giusti

Ronaldo Giusti Abreu nasceu em São Luis do Maranhão em 11.07.59, formou-se em Direito pelo então Cesep (hoje Unama, Belém), em Agosto de 1982. Desembarcou em Marabá nos idos de abril de 1984, ano em que lançou, em dezembro, seu “Canto Inicial”, obra poética. Foi duas vezes presidente da sub-secional da OAB; em julho de 96 tornou-se executor do Incra; também foi Procurador Geral do Município. Dedicado à Advocacia, também não descura da sua arte. Veja abaixo a nova poesia de Ronaldo Giusti, coletada do site “A poesia é necessária” (http://ronaldo.giusti.zip.net) Vadico... dona maria a enrolar charutos que o menino venderia nas ruas estreitas de são luís e assim o status de adulto: aos doze anos o primeiro gole a primeira mulher o que restou da boêmia: na bainha, espada de penicilina soldado à paisana na guerra contra o exército de bacilos era como se planasse ladeira abaixo e era sábado (a camisa de algodão inflada pelo vento quente da tarde) o maldito salva-vidas a gritar: lá vem golias! lá vem mata-gato! lá vem massiste! na oficina: a solidão dos relógios o carrilhão na parede a espera do conserto que não virá sexta-feira à noite: os cabarés da Côndor minha iniciação sexual que já não seria apenas uma mentira pai... na terça-feira gorda quando já não havia qualquer esperança de folguedo um anjo do mal lhe pegou pela mão e levou-lhe para um lugar desconhecido pai... vem o passado (embrulhado em papel de pão) e diz que já é tempo de pagar o conserto da velha máquina de escrever o passado é a velha tecla empoeirada suja de tinta e lubrificante que “seu” jordão limpava com paciência e sabia que ela jamais seria a mesma e já não gravaria como antes na branca pele do papel “chamex” mas a tecla do teu sorriso iluminada pelos olhos de criança cravava em mim um chamado (algo que jamais entendi) talvez um apelo que detrás da porta me acompanharia os passos para sempre o aguardente animava o final da tarde que o trabalho árduo preenchera de cansaço raimundo que não sabe ler nem escrever aceitou o desafio do patrão discordou do amo e por isso ganhou de prêmio terçadadas que pelo corpo inteiro lhe fazem lembrar do preço de ser homem estou entre a rudeza das mãos em desalinho e a candura dos lábios que buscam em fala gestos e sussurros estou entre a flor entreaberta e o falo que a despetala e assim não há morte mas a fugaz sensação de um eterno recomeço Sábado à tarde. O sol ferve a água tocantina. Eu posso vê-la borbulhando da janela do escritório. Nada me diz que ela voltará ao leito natural do rio, tão cedo. Nada é novidade nesta tarde nem mesmo nos acampamentos onde os flagelados se amontoam e fazem fila à espera do pão, o pão em cesta básica que o chefe da Defesa Civil distribui como esmola... eu a colhi como uma flor o coletivo subindo a ladeira (minha cabeça para fora da janelinha) às duas da tarde no caminho para o centro educacional do maranhão tínhamos 13 anos e a inocência a vencer o beijo sem volúpia o sexo a brotar na calça (saia) curta do uniforme escolar o namoro durou apenas o ano letivo depois os dias quentes a brisa da avenida beira-mar e o exame de admissão para o liceu maranhense nos separaram definitivamente por onde anda maria lúcia ribeiro? é mãe tia avó? aos 46 anos de idade casou-se separou-se suicidou morreu de parto ou de doença? é dona-de-casa operária dentista ou advogada? não não quero resposta! como gullar quero apenas perguntar: algo que ficou sem resposta e que assim ficará para sempre

quinta-feira, 17 de maio de 2007

Em primeira mão

Para comemorarmos os quase dois mil acessos registrados deste blog, antecipo aos leitores o teor da minha página "Política & Desenvolvimento" que deverá circular na edição de sexta-feira (amanhã) no jornal Correio do Tocantins. Obrigado, leitores! Distrito Sustentável. Só para alguns Tornar sustentável a produção de ferro gusa, a principal matéria-prima do aço, nos estados do Maranhão e do Pará é o objetivo do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) com a proposta de criação do Distrito Florestal Sustentável (DFS) do Pólo Carajás. A idéia foi discutida dia 27 de fevereiro em seminário realizado em Belém (PA) com a presença de representantes da indústria siderúrgica da região, do governo estadual, organizações não-governamentais, Ministério Público e do Ibama. O DFS tem entre 25 milhões a 30 milhões de hectares, numa estatística modesta, dos quais 40% desmatados. As Unidades de Conservação e as Terras Indígenas, protegidas por lei, mal chegam a 11% (7 reservas indígenas e os 1,5 milhão de hectares sob tutela da Vale no entorno de Carajás). Outros 3 milhões de hectares constituem os assentamentos (em torno de 400). “A principal atividade do DFS terá de ser o reflorestamento e a recuperação de áreas com espécies e sistemas que permitam abastecer a indústria siderúrgica, com uma fonte sustentável de carvão”, disse em Belém o diretor do SFB, Tasso Azevedo, frisando que seria preciso criar linhas de financiamento específicas, prestar assistência técnica aos produtores de carvão vegetal e ter um canal de interlocução com os assentamentos rurais para acompanhar a atividade. “A idéia é criar uma cadeira de produção que desloque quem hoje trabalha com o desmatamento para produzir carvão, para que essas mesmas pessoas passem a trabalhar com o plantio de florestas para produzir o carvão”, explicou. As siderúrgicas do Pólo de Carajás, movidas a carvão vegetal, têm quatro fontes principais: madeira proveniente de áreas desmatadas ilegalmente, do plantio de florestas ou do manejo da floresta nativa e de resíduos de serrarias. Anualmente, segundo o próprio Tasso Azevedo, o desmatamento para alimentar as fornalhas pode chegar a 100 mil hectares por ano. O volume anual de madeira queimada é avaliado em cerca de 14 milhões de metros cúbicos, mais da metade do que consomem todas as 3 mil serrarias da Amazônia. “Historicamente, houve um erro estratégico ao não pensar na sustentabilidade do pólo siderúrgico de Carajás. O pólo foi instalado no inicio da década de 90, sem pensar na questão ambiental. Sem imaginar que ia necessitar de uma boa quantidade de florestas para alimentar os fornos siderúrgicos. A partir daí, houve um processo forte de pressão em cima da floresta nativa. De forma indireta, a produção de carvão vegetal para a siderurgia do Pólo de Carajás acabou fomentando o desmatamento e o uso predatório naquela região”, admitiu o diretor de Florestas do Ibama, Antonio Carlos Hummel, no encontro de Belém. Coincidência ou não, à tarde do mesmo dia 27 de fevereiro guseiros da região de Carajás relançaram em Brasília o Fundo Florestal Carajás, que financiará o plantio de florestas produtivas ao longo da ferrovia. A cada tonelada exportada serão enviados US$ 3 para o Fundo Florestal, registrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e dirigido por um Comitê de Fiscalização. Os recursos enviados para esse fundo só poderão ser resgatados se a empresa comprovar que cumpriu o plantio de florestas produtivas. Carajás responde hoje por mais de 60% da exportação brasileira de ferro gusa, estimada em 3 milhões de toneladas/ano e um bilhão de dólares em divisas. A empresa deve plantar, no mínimo, 833 mudas de espécies florestais por hectare, em área mínima de 500 hectares. O investidor poderá realizar o plantio de mudas de qualquer espécie florestal (nativa ou não) que tenha como objetivo a formação de um estoque de biomassa para produção de carvão vegetal. Com isso, as siderúrgicas esperam garantir que o reflorestamento atenda a 100% da demanda de carvão vegetal das empresas instaladas ao longo da ferrovia Carajás. Brasas e sardinhas Em linhas gerais, este é o objetivo do Distrito Florestal Sustentável de Carajás. Mas, da forma como foi colocada sua implantação, na audiência desta semana em Marabá, nem parecia que seu objetivo a médio prazo é investir recursos públicos no socorro de madeireiras falidas e de guseiros, digamos, imprevidentes – para não falar em descompromisso ambiental. Ao contrário, o presidente da associação local de produtores de ferro gusa, Afonso Albuquerque Oliveira, disse que as siderúrgicas do Pólo de Carajás não desmatam. Botou a culpa nos carvoeiros. Outros interlocutores insistiram na necessidade de ampliar a área do distrito e reduzir de 80% para 50% a chamada reserva legal. Dizendo-se à beira da falência, carvoeiros falaram da disposição de trabalhar na legalidade e até informaram da constituição de um fundo (reserva de R$ 0,30 por tonelada de carvão) para financiar o plantio de espécies. O representante do governo estadual disse que entre o hoje e 2015, marco da sustentabilidade de carvão honesto, a transição terá de ser dentro da legalidade, e vai haver mais rigor no combate ao carvão bandido (60% do consumido pelas guseiras). Também traçou três cenários possíveis para o problema: 1) a redução da produção de gusa; 2) o aproveitamento dos resíduos dos desmatamentos legais, como fontes viáveis; e 3) o uso de carvão mineral ou coque importados – o insumo mais poluente detodas as fontes de energia. E bem aqui, vale frisar, os guseiros vão atar-se com o Ministério Público por conta da emissão de gases tóxicos. É que o Distrito Industrial de Marabá fica a montante da zona urbana e esses gases virão para dentro da cidade. Sensatos mesmos foram os representantes de assentados e clientes da reforma agrária, ao discordarem de qualquer proposta que os transforme em plantadores de eucalipto, como ficou implícito ao longo da justificativa do projeto. E estão cobertos de razão. Porque enquanto se fala em plantio em larga escala de eucalipto para fazer carvão, no Rio Grande do Sul o Ministério Público Federal no Estado ingressou na Justiça Federal com uma ação civil pública com o objetivo de evitar que “espécies exóticas” tomem conta do Parque Nacional da Lagoa do Peixe. As exóticas são principalmente pinus, e, em menor escala, eucaliptos. O biólogo Demétrio Luís Guadagnin relata que o pinus é considerado uma espécie predadora, porque não permite que nenhuma vegetação se desenvolva embaixo da árvore. Reproduzido de forma anemocórica (dispersão pelo vento), o pinus se dispersa para além da área de plantio (contaminação biológica) e "as mudas surgem em todo o canto e competem com as espécies nativas, impedindo o crescimento delas”, consumindo água em grande quantidade. O contexto do DFS Na tarde de 14 de maio, ninguém falou em políticas públicas para saúde, educação, saneamento, transporte e estímulo à produção agrícola no contexto do distrito florestal, espaço marcado pela dependência estadual da importação de gêneros alimentícios de outras unidades da federação e de significativas perdas econômicas por parte de agricultores locais, em razão de sua incapacidade de agregar valor à produção através de processos industriais de beneficiamento. As cidades abrangidas pelo DFS Carajás dependem quase que inteiramente da produção de outros estados para obter suprimentos arroz, feijão, batata, hortaliças. Até a farinha de qualidade vem de fora. resultado, muitas das hortaliças comuns na mesa dos brasileiros de outras partes do país são inacessíveis à população ou, na melhor das hipóteses, chegam ao consumidor a preços exorbitantes e com má qualidade em razão do tempo decorrido desde a colheita. Não faz muito tempo, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) propôs que se deveria fazer sentar à mesa todos os atores do drama amazônico - agricultores, pecuaristas, madeireiros, mineradores, juntamente com representantes do governo e da ciência -, sob pena de continuarmos seguindo em direção ao pior. Pelo que se viu dia 14 na plenária da secretaria de saúde, onde não havia nenhum representante da ciência, devemos preparar-nos para o apocalipse. Impactos ambientais A Comissão de Ecologia, Meio Ambiente, Geologia, Mineração e Energia da Assembléia Legislativa do Estado vai promover audiência pública em Marabá, para debater a implantação do projeto Salobo – o maior dos cinco projetos de cobre da Companhia Vale do Rio Doce no Pará. Outro evento igual, mas em Parauapebas ou Canaã dos Carajás, vai abordar a relação da multinacional com as comunidades do entorno de suas minas. A data ainda não está definida para estas iniciativas no sudeste paraense, mas a agenda de oitivas públicas do Legislativo para este ano começará pelo Baixo Amazonas, dias 22 e 23 de junho, quando os parlamentares avaliarão os impactos da Alcoa em Juruti e a atividade garimpeira nos rios Paru e Jarí. Barcarena e a Região Metropolitana de Belém também estão incluídas na programação. Pra quem? O coordenador David Leal, do Programa de Desenvolvimento de Fornecedores (PDF) da Federação das Indústrias do Pará (Fiepa), disse em Belém que até 2010 serão criados mais 33 mil postos de trabalho no Pará, graças ao investimento de US$ 7,5 bilhões a ser feito pela Companhia Vale do Rio Doce, Alcoa, Albras, Alunorte, Celpa, Globe Metais, Imerys RCC, Mineração Rio do Norte, Pará Pigmentos e Schincariol. David Leal só não explicou a quem se destinam esses empregos no interior paraense, se em três anos não será possível qualificar a mão-de-obra local. Biodiesel e latifúndios Com financiamento da organização não governamental inglesa Carbon Positive, desde 2006 a Embrapa Amazônia Oriental, com sete em Belém, vem testando o plantio e produtividade de mamona, pinhão manso, teka, mogno africano, paricá, tachi e até seringueiras no sul do Pará. Interessado no experimento, o deputado federal Giovanni Queiroz disponibilizou 60 hectares de sua fazenda no município de Pau d’Arco, a 50 km de Redenção, com vista à produção de biodiesel – a panacéia do 3º milênio. Já o empresário Daniel Dantas (Oportunity/BMG) vem comprando adoidado fazendas na região. São suas, agora, a Espírito Santo , Cedro e Maria Bonita (todas ex-Bené Mutran) e parte da Boa Esperança (do espólio de Fausto Ribeiro. A finalidade de Dantas é uma incógnita, mas presume-se que tanta terra vai virar poços de biodiesel e etanol Predadores Madeireiros de Paragominas, responsáveis pela devastação de florestas do leste do Pará, estão disputando com rivais de Mato Grosso e Rio Grande do Sul uma extensa área do planalto santareno, região do rio Arapiuns e áreas federais do oeste paraense, onde 500 famílias de pequenos agricultores já foram expulsas nos últimos dois anos por pistoleiros e milícias armadas. As terras, em sua maioria, pertencem à União Federal e ao Estado do Pará, mas os grileiros, sojeiros e madeireiros agem como se fossem os verdadeiros proprietários. A informação é do jornal mato-grossense “24 Horas News” “Ousados, diz o jornal, eles fecham estradas e constroem guaritas para impedir a entrada de fiscais e estranhos. É a política do vale tudo embrulhada no papel celofane do progresso e desenvolvimento econômico. Para poucos barões do campo, é claro”. A mata, depois de derrubada para extração de madeira, vira campo de soja. Em menos de três anos, 80 mil hectares de florestas deram lugar às plantações de soja, gerando uma produção superior a 4 milhões de sacas e faturamento de R$ 300 milhões. Esse valor equivale a duas vezes o orçamento do município de Santarém. O custo social desse progresso, porém, é indigesto para pequenas comunidades que há décadas sobrevivem da pesca e da roça no interior da floresta amazônica. Quem resiste às pressões para deixar as terras acaba figurante de uma lista de marcados para morrer, como a diretora do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém, Maria Ivete Bastos. Temendo uma emboscada, ela anda pela região sempre acompanhada por um grupo de agricultores. A sindicalista denunciou por diversas vezes as ameaças que vem recebendo, mas a polícia local não tomou nenhuma providência. Os empresários da soja e madeireiros, por sua vez, consideram Ivete Bastos um entrave ao desenvolvimento econômico da região. Peixada Vendedor ambulante de peixe se acomoda no tamborete de lamentações e solta o verbo. Para vender um pouco mais barato, tem de comprar o pescado diretamente do pescador, ainda na beira do rio. Porque se o produto entra na Colônia Z-30, sai de lá tão caro que não permite margem de lucro. Além do mais, prossegue o trabalhador, o pouco do peixe que escapa da venda sem controle em porto clandestino de Jacundá, à beira do lago da hidrelétrica, nem esfria direito na geleira da Z-30 – sai mais que depressa de Marabá, em larga escala, para outros Estados, deixando em jejum o consumidor marabaense. Moral da história: é por isso que aqui o peixe sem criação e sem vacina é mais caro do que a carne de primeira do boi sem aftosa. Problemão no HR As prioridades do Hospital Regional de Marabá são os casos que envolvem traumatologia e neurologia. Mas, como faz um mês que o aparelho de ressonância magnética e tomografia computadorizada está quebrado, os pacientes estão sem atendimento ou são obrigados a viajar por conta própria para Belém ou Araguaína (o Estado não custeia TFD - tratamento fora do domicílio).A demanda mais prejudicada é a de tratamento de traumatismo: acidentes de veículos, sobretudo. E fonte da 11ª. Regional da Sespa, com sede aqui, informa não existir também qualquer previsão de conserto do equipamento. Indelicadeza? Indagados se foram convidados para o encontro do Planejamento Territorial Participativo (PTP) no último sábado (12) em Marabá, os deputados Geovanni Queiroz (PDT) e Wandenkolk Gonçalves (PSDB) disseram que não. Também não foram lembrados pelo cerimonial do governo para a discussão do Distrito Florestal de Carajás na segunda-feira, 14, na secretaria de Saúde. Nem eles, adianta uma fonte, nem Zequinha Marinho, nem Bel Mesquinha, ambos do PMDB, com representatividade na região. “E o Asdrúbal (PMDB) estava lá por iniciativa pessoal”, acrescentou. ######DRT-154### Dia de luta Entidades do movimento social, sindical, comunitário, juventude, mulheres, negros e negras, ou seja, de todos os segmentos afetados pelo plano econômico do governo federal, estão sendo convocadas para uma plenária hoje, a partir das 18h00, no campus da UFPA. Na pauta, a participação de Marabá no ato público nacional marcado para 23 de maio, em defesa dos direitos da classe trabalhadora. “O governo Lula vem propalando uma série de medidas para dar continuidade em suas reformas com a desculpa de “diminuir o rombo da previdência”, mas, diga-se que esse rombo é causado pelos empresários sonegadores; o governo também fala em “melhorar a legislação trabalhista”, mas essa melhora beneficiará mais uma vez os patrões, desobrigando-os de respeitar direitos trabalhistas já conquistados como férias, 13º, licença maternidade e FGTS”, diz o convite. Dias de ira Trabalhadores da saúde e da educação em Marabá vão à greve por tempo indeterminado a partir de hoje, com concentração à entrada do Núcleo Pioneiro. Todos consideram um escárnio a proposta de 6% de reajuste salarial do prefeito Tião Miranda. Basa Será em Marabá a inauguração de uma das cinco novas agências que o Banco da Amazônia pretende construir até fim do ano. As outras ficam em Belém, Manaus, Palmas e Várzea Grande. Digital Prefeitura de Marabá divulga licitação para a compra de computadores para a escola Judith Gomes Leitão. A luta continua Bento XVI não disse uma palavra sobre a morte, em Anapu (PA), da missionária Dorothy Stang, em 12 de fevereiro de 2005, que esta semana rendeu 30 anos de cadeia a Vitalmiro Bastos, o Bida, um dos mandantes do crime. Mas a vítima foi lembrada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em documento sobre a Amazônia no qual faz a defesa do ambiente e aponta problemas que a Igreja Católica enfrenta na região. O texto cita também ameaças sofridas por religiosos que defendem populações da Amazônia, como o bispo dom Erwin Kräutler, da prelazia do Xingu, que defende as comunidades contra a ação de pecuaristas e fazendeiros, e dom Geraldo Verdier, de Guajará Mirim (RO), que denunciou torturas policiais. Não sei, não A instalação de uma base avançada do Grupamento Aéreo Integrado do Estado do Pará (Graer), no sudeste paraense e a disponibilização de um helicóptero para as ações de segurança publica, fizeram cair em 85% o índice de criminalidade em Marabá. É o que diz estatística do Comando CPR2, segundo o site do governo. Devem ter deixado fora da estatística as execuções sumárias jamais desvendadas.

Direto ao ponto

Sob o título “Marabá – propostas para uma política de desenvolvimento”, levei minha contribuição pessoal ao governo, na plenária do Planejamento Territorial Participativo (PTP) no último sábado (12) em Marabá. A portadora foi a deputada Bernadete ten Caten, que prometeu encaminhá-la ao gabinete de Ana Júlia.
Façam bom proveito. INTRODUÇÃO O Pará não é só o Estado mais desenvolvido da região amazônica, como aquele que apresenta o maior grau de complexidade de seus problemas. Com o segundo maior PIB da Amazônia, os setores industrial, de serviços, agropecuário e o extrativismo mineral e madeireiro em desenvolvimento, o Pará ao mesmo tempo abriga um grande contingente de populações tradicionais, ribeirinhas e indígenas, que são diretamente afetadas pela modernidade que as cerca. Configura-se, pois, num complexo mosaico em que convivem o moderno e o tradicional, em constante tensão.[1] Dentre outros estados amazônicos, o Pará foi dos primeiros a ter grandes áreas de florestas desmatadas pelo avanço da frente agrícola brasileira, em função da Política de Integração Nacional do governo federal, atraindo investimentos dos diversos segmentos, principalmente do setor agropecuário. A agropecuária se difundiu ao longo da rodovia Belém-Brasília e outros eixos viários, tendo sido acompanhada pela exploração madeireira, ambas geradores de fortes impactos sobre os recursos naturais. Por outro lado, a mineração em poucos anos se transformou em um dos grandes eixos da base produtiva estadual, fortalecendo sobremaneira o setor industrial com a agregação ao setor de grandes projetos minero-metalúrgicos. Sobrepondo-se a essa base econômica verificou-se um intenso fluxo migratório para o Estado, exemplificado pelo fato de 44,2% dos assentamentos do Incra localizados na Amazônia se encontraram no Pará. Esse conjunto de fatores levou à antropização de 15% de seu território. Promovido pela Comissão da Amazônia e de Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados e pela Secretaria de Coordenação da Amazônia, do Ministério do Meio Ambiente, realizado nos dias 28 a 30 de junho de 2000, o seminário “Agenda Positiva da Amazônia” apontou propostas que ainda hoje permanecem válidas para o Estado e, em especial, para o Sul do Pará. No intróito da Agenda Positiva do Estado do Pará, o relatório final anota que “o desafio que se apresenta para os vários níveis de governo, a sociedade civil e o setor produtivo, é, sem abrir mão do desenvolvimento econômico do Estado, conter o processo de devastação dos recursos naturais que o desenvolvimento engendra”.[2] No sentido do enfrentamento desse “desafio”, o governo estadual e a sociedade contribuíram com propostas que permanecem válidas, hoje, quando se acentuam a depredação e o desperdício das possibilidades de desenvolvimento econômico-social, muito mais do que antes. A MESORREGIÃO DO SUDESTE DO PARÁ Compõem a mesorregião do Sudeste Paraense as seguintes microrregiões: Tucuruí, Paragominas, São Félix do Xingu, Parauapebas, Marabá, Redenção e Conceição do Araguaia.[3] Embora sua ocupação tenha se iniciado efetivamente no século XVIII, através da garimpagem e da pecuária extensiva, somente na segunda década do século XX é que se observava, na mesorregião do Sudeste Paraense, um contingente populacional pequeno mas estável, originado na coleta da castanha-do-pará, e que fez de Marabá a cidade mais importante da região, posição que ocupa até hoje. O desenvolvimento teve início a partir da construção da rodovia BR-010/153 (Belém-Brasília), que transformou a mesorregião numa das mais dinâmicas da Amazônia, nos aspectos econômicos, tensões sociais e problemas originados com a chegada dos grandes capitais. A partir do final da década de 50, a região passa a ser reconhecida como fronteira de recursos, a mesorregião vem experimentando uma intensa revitalização, apoiada pela implantação de infra-estrutura e por diversos programas governamentais, entre os quais se destacam a política de incentivos fiscais, coordenada pela extinta SUDAM, e os financiamentos especiais obtidos através do PROTERRA e do POLAMAZÕNIA. A elaboração do Programa Grande Carajás representa o ponto alto desses regimes especiais de incentivos, extrapolando sua atuação e influência física para fora dos limites da mesorregião e economicamente, complementando elos com regiões internacionais. O Projeto Ferro Carajás, delineado na década de 70, tem previsão de quatrocentos anos de exploração do solo do período Pré-Cambriano, com potencial em ferro, ouro, manganês, níquel, cobre, bauxita e cassiterita entre outros minerais. Constitui-se no principal empreendimento desse Programa que ainda compreende outros projetos de agricultura, pecuária, pesca, agroindústria, reflorestamento, beneficiamento de madeira, indústria siderúrgica, aproveitamento de fonte energética etc. Por tudo isso, problemas específicos surgem a cada avanço da fronteira do desenvolvimento, tensões são constantes, seja por questões fundiárias, seja por questões ambientais, pelo aumento do êxodo rural e pela intensa migração de outras regiões do país. A PA-150, no sentido Norte/Sul, é a principal via de transporte, pois interliga direta ou indiretamente todas as suas sedes municipais, com exceção do Município de Paragominas, às margens da BR-010; a BR-158, continuação da PA-150, e que penetra no Estado de Mato Grosso; a BR-230, (Transamazônica), que interliga a mesorregião com o Nordeste, com o Estado do Tocantins e com o restante da Amazônia; a PA-279, que liga os vales dos rios Xingu e Araguaia; a PA-275, que serve a área de Serra Pelada e as minas de Carajás, e a BR-222, que faz a conexão entre a Belém-Brasília e o vale do Tocantins. É, ainda, a única região do Estado a possuir uma ferrovia, construída sob excepcionais condições técnicas e portadora de grande capacidade de transporte de cargas, passageiros, além do transporte de minério de ferro. Sua ligação com os portos de Ponta da Madeira e de Itaqui, em São Luís (MA), proporciona grandes perspectivas para o desenvolvimento da mesorregião.[4] Marabá constitui-se no maior centro urbano da região, o mais bem equipado, além de funcionar como entroncamento rodoferroviário. Sua influência se faz sentir por toda a região, estendendo-se às áreas vizinhas do Estado. Paragominas foi a primeira cidade, das que foram fundadas no decorrer do avanço das fronteiras de recursos, que se desenvolveu rapidamente. Devido a sua posição geográfica, tem relacionamento direto com outras áreas do Pará e Maranhão, alcançando uma certa independência em relação à subordinação que os demais centros urbanos têm à estrutura organização do Sudeste Paraense. Apesar de toda essa vitalidade proporcionada por maciços investimentos, uma das mais importantes atividades da mesorregião – a agricultura – necessita valer-se de manejos criteriosos de solo, uma vez que (exceto em determinadas áreas do Município de São Félix do Xingu, dotadas de terras roxas) predominam solos caracterizados por uma baixa produtividade. PRINCIPAIS CENÁRIOS E TENDÊNCIAS PARA A MESORREGIÃO DO SUDESTE PARAENSE (2002-2010) Em diagnóstico elaborado pela Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento da Universidade Federal do Pará, a instituição indica algumas tendências do sudeste paraense num horizonte de médio prazo: Estar localizada na região a maior província mineral do planeta; Dispor de um grande potencial de recursos hídricos (bacia dos rios Araguaia e Tocantins); Crescimento econômico moderado, tendendo a intensificar-se no final da década; Crescimento demográfico acima da média nacional, principalmente em função do intenso fluxo migratório, predominantemente pala população de baixa renda e com baixa formação acadêmica e qualificação profissional, oriunda dos Estados do Nordeste; Crescimento exacerbado das demandas, pressionando o poder público local, por serviços e produtos nas áreas de saúde, educação, saneamento, habitação etc., como conseqüência do aumento demográfico desordenado e muito acima da capacidade de resposta dos governos municipais; Universalização do ensino fundamental e médio, implementação do ensino profissionalizante e necessidade da ampliação da oferta de cursos universitários; Investimentos significativos na qualificação de mão-de-obra, em consonância com as vocações regionais, para atender as novas demandas do mercado, em face da reordenação do modelo de desenvolvimento regional; A conclusão das obras e a entrada em operação das Eclusas de Tucuruí transformarão a Hidrovia Araguaia-Tocantins em um dos maiores corredores de exportação de grãos do país; A expansão na geração de energia, com a duplicação da Hidrelétrica de Tucuruí, estimulará investimentos para a implantação de indústrias de transformação na região; A disponibilização de alternativas para o escoamento da produção dos Estados da Região Centro-Oeste e das regiões sul e sudeste do Pará, através de vias fluviais e rodoviárias (Eclusas de Tucuruí e Alça Viária), induzirá os empresários a intensificarem os investimentos na agricultura, pecuária e indústria, agregando valores com a implantação de frigoríficos, fábricas de laticínios, calçados e acessórios de couro, polpa de frutas e beneficiamento de grãos e amêndoas (derivados da soja, do milho e do dendê, entre outros); Alteração da estrutura produtiva regional, possibilitando maior diversificação e verticalização de cadeias produtivas, tais como metalurgia e agroindústria; Implantação e implementação de um pólo industrial minero-metalúrgico para a transformação do minério extraído das minas de Carajás, Salobo e outras, em produtos elaborados e semi-elaborados; Implantação de um pólo joalheiro, com a qualificação de mão-de-obra local (formação de Design), para a transformação do ouro e pedras preciosas e semi-preciosas em jóias; Implantação do Pólo Turístico do Araguaia-Tocantins, para a exploração do ecoturismo e do turismo de eventos (pesca esportiva) no lago de Tucuruí, formado pela Hidrelétrica, que é o paraíso dos pescadores esportivos; A diversificação e o aumento da exploração mineral, possibilitarão ao Estado e aos Municípios que estão sob a área de influência dos grandes projetos minero-metalúrgicos, um incremento na arrecadação de impostos e royalties, permitindo maiores investimentos em infra-estrutura, proteção e promoção social; Moderado impacto ambiental em razão da difusão de tecnologias sustentáveis, mudança do perfil da demanda mundial por insumos e recursos naturais, e da existência, mesmo incompleta e com parcial efetividade, de um sistema de gestão ambiental; Leve declínio do desemprego em função dos investimentos na qualificação da mão-de-obra e na diversificação e verticalização de cadeias produtivas; Fortalecimento de formas organizativas da sociedade civil. GRANDES PRIORIDADES DO SUL E SUDESTE DO PARÁ O projeto da Hidrovia Araguaia Tocantins consta no Plano Plurianual (PPA), Avança Brasil do governo federal. Além da hidrovia, o PPA deseja incentivar a monocultura da soja e a construção de várias usinas hidrelétricas nos dois rios. Considerada o mais importante para a economia paraense quanto à movimentação e exportação futuras de mercadorias, e implementada pela Administração das Hidrovias da Amazônia Oriental (Ahimor), a Hidrovia Araguaia-Tocantins vai inserir o Estado na rota dos grãos produzidos na região central do país formando um corredor de 3.500 km ligando Nova Xavantina (MT) ao porto de Vila do Conde, em Barcarena, reduzindo o custo do frete por tonelada de R$ 60 para até R$ 20. No Pará, a hidrovia se estende por cerca de 500 km. Sua construção representaria a geração de mais de 850 mil empregos e seu efeito na economia nacional seria de impacto positivo multiplicador. A hidrovia será também a alternativa mais barata para o escoamento da produção de grãos do recém-nascido pólo agroindustrial do sul do Estado. Em relação aos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR), por exemplo, a viagem até Roterdã, na Holanda, onde se comercializa grande parte das commodities agrícolas produzidas no mundo, será reduzida em 7 mil quilômetros. Atualmente, o licenciamento do trecho da hidrovia compreendido por 1.230 km do rio Araguaia, 552 km do rio das Mortes e 420 km do rio Tocantins está sendo impedido por duas ações do Ministério Público. As Eclusas de Tucuruí – Histórico Os rios Tocantins e Araguaia atravessam as regiões Centro-Oeste e Amazônica, banhando mais de 2 mil quilômetros de terras comprovadamente dotadas de imensas riquezas minerais e com vocação natural para a agropecuária. Se transformados em hidrovias, poderão ser fatores determinantes da exploração em larga escala desses recursos, pela possibilidade de direcionar a produção regional do Brasil Central, desde Barra do Garças até o porto flúvio-marítimo de Vila do Conde, em Barcarena (PA), que está localizado em posição privilegiada em relação aos mercados americano, europeu e do Oriente Médio. Para que a produção dessa região apresente condições de competitividade com outras áreas mais próximas do litoral ou dos grandes centros, é fundamental a existência de uma via de transporte de baixo custo operacional, como só a hidrovia pode oferecer. A construção da barragem de Tucuruí, no rio Tocantins, a 250 quilômetros de sua foz, teve como finalidade primordial a geração de energia. A barragem seccionou a hidrovia, exigindo obra de grande porte capaz de vencer um desnível de 72 metros criado por ela. Dessa forma, o aproveitamento de Tucuruí compreende, também, um Sistema de Transposição de Desnível, localizado na margem esquerda do rio Tocantins e constituído por duas eclusas e um canal intermediário, adequadamente alinhados, cujo objetivo precípuo é dar continuidade à navegação no trecho da hidrovia interrompido com a construção da barragem. Entre 1979 e 1981 foi desenvolvido, pela então Portobrás, o Projeto Básico do Sistema de Transposição de Desnível de Tucuruí. Decidiu-se pela implantação de um sistema composto por duas eclusas, de maneira a se permitir a transposição do desnível em duas etapas de aproximadamente trinta e seis metros cada uma. A eclusa de montante (Eclusa 1) está localizada junto à barragem de terra da margem esquerda, enquanto a eclusa de jusante (Eclusa 2) localiza-se logo abaixo do porto da Eletronorte , próximo da cidade de Tucuruí. As duas eclusas são interligadas por um canal navegável contido, na sua margem esquerda, pelo terreno natural e, na sua margem direita, por um dique de 5,5 mil metros de extensão. Em 1981, através de contrato com a empresa Construções e Comércio Camargo Corrêa S.A., foram iniciadas as obras do Sistema de Transposição de Desnível pela Eclusa 1, obras essas consideradas como obrigatórias para permitir o enchimento do Reservatório. Até 1984 as obras tiveram andamento normal e, a partir daí, o ritmo das mesmas foi diminuindo, até a total paralisação em 1989. Em 1997, foram elaborados Estudos Técnicos de Atualização do Projeto Básico, necessários à conclusão das Eclusas de Tucuruí. Essa Atualização foi necessária para se levar em conta, dentre outros aspectos, as modificações ocorridas ao longo do tempo, no tocante às condições de navegação da hidrovia; aos avanços da tecnologia na elaboração de projetos e na execução de obras; às alterações da situação econômica do país, e a toda a realidade com que se depara o processo de desenvolvimento nacional. Foram, também, estabelecidas as dimensões limites dos comboios que deverão freqüentar o Sistema de Transposição, conferindo-lhe uma capacidade efetiva de carga que atenda às necessidades do desenvolvimento das atividades agrícola, pecuária, da indústria extrativa e as necessidades de abastecimento das populações da região. Os investimentos na primeira fase do empreendimento foram da ordem de R$ 135 milhões, dos quais R$ 118,4 milhões, corresponderam às obras civis já executadas até 1989 e que incluíram cerca de 431.000m3 de concreto massa, 1.800.000m3 de escavação comum e 260.000m3 de escavação em rocha. Em setembro de 1998, foi estabelecido o Termo Aditivo ao Contrato DT-TUC-100/81, para a conclusão das obras civis das eclusas de Tucuruí, Mas, atualmente, as escavações de terra e rocha, obras de estruturas de concreto estão paralisadas. (Diário do Pará 13.jul.03) A industrialização local dos recursos minerais e agropecuários No sul/sudeste do Pará encontram-se as maiores reservas minerais do planeta, representadas pelo complexo de Carajás, e o maior rebanho bovino do Estado. Não obstante, faltam desde uma política mineraria para o setor quanto um processo de beneficiamento industrial da produção agrícola e da pecuária. A CVRD – UM CASO À PARTE A Companhia Vale do Rio Doce é responsável por 16% do Produto Interno Bruto do Pará, o segundo Estado em tamanho (com 1,2 milhão de quilômetros quadrados) e o nono em população (com mais de seis milhões de habitantes) do Brasil. No final desta década, essa participação poderá se aproximar de um terço do PIB paraense. Em nenhuma outra unidade da federação uma única empresa pesa tanto na economia estadual. A CVRD fatura, no Pará, muito mais do que o próprio governo estadual. Evidentemente Vossa Excelência conhece todos esses dados, mas não custa reiterá-los. Afinal, tudo isso chega a ser assustador do ponto de vista de quem reside no centro mesmo da região que constitui o palco dessas operações gigantescas e, em regra, pouco ou nada benéficas para as populações residentes em sua área de influência. Ao custo de um bilhão de dólares, o projeto cobre Salobo é o mais importante de todos os projetos da Companhia Vale do Rio Doce no sul do Pará. Sua reserva de 780 milhões de toneladas, é maior do que a soma dos depósitos do Sossego (191 milhões/ton), Alvo 118 (60 milhões/ton), Cristalino (200 milhões/ton), Igarapé Bahia (15 milhões/ton), Campo Alemão (170 milhões/ton). Juntos, esses projetos vão consumir apenas cerca de US$ 144 milhões a mais do que o Salobo, que tem implantação iniciada em 2006 e operação prevista para junho/2008. Em Canaã, só em perfuração a MSS gastou 20 milhões de dólares, à razão de 100 dólares cada metro perfurado. Provavelmente este é o mesmo preço que a Vale gasta com prospecções no projeto Salobo, onde, até aqui, nenhuma empresa sequer recolhe o Imposto sobre Serviços (ISS) devido à nossa prefeitura. Tecnicamente, ainda hoje a região do Salobo tem sido uma espécie de terra de ninguém, marcada pela ausência das instâncias de governo, inclusive o municipal, e de onde as notícias nos chegam somente pela via dos informes de divulgação da própria Vale. Por iniciativa da Câmara Municipal, no segundo semestre de 2002 realizou-se em Marabá um seminário sobre a empresa, seus projetos no Estado, no Sul do Pará, e suas relações com o entorno de tais enclaves, e duras críticas foram feitas à conduta (considerada colonial) da empresa, que continua explorando os recursos naturais da região, sem induzir a retenção da renda gerada, indiferente à miséria que se espraia a partir do lado de fora dos seus mega-projetos, em Carajás. Lúcio Flávio Pinto, um dos palestrantes, mais tarde escreveria um texto definitivo sobre esta miséria itinerante: “Um dos casos mais exemplares desse procedimento pode ser visto diariamente na estação de passageiros da ferrovia de Carajás. Dezenas de imigrantes, na sua esmagadora maioria maranhenses, desembarca em Marabá sem portar um único documento de identificação. Não-identificados sobem nas estações do Estado vizinho e na mesma condição chegam ao ponto de origem. Criminosos se aproveitam da franquia para procurar novo domicílio para seus delitos e pessoas "de bem" são despejadas na marginalidade pelo simples fato de que não possuem qualquer documento que as habilite a disputar um emprego regular. Um ato primário de controle, praticado em qualquer aeroporto e mesmo em estações rodoviárias é ignorado ao longo da ferrovia de Carajás, cruzando, em seus 870 quilômetros de extensão, uma das áreas mais pobres do Brasil. Marabá é particularmente maltratada por essa situação. As minas em atividade, que proporcionam royalties, ficam em municípios que surgiram de desmembramento a partir da unidade-mãe. Mais importante município de toda a região, Marabá perdeu renda e território com essa pulverização e ficou com os restos do banquete, na forma de migrantes miseráveis, despreparados profissionalmente ou vinculados a uma estrutura de crimes para a qual servem como vetores de marginalidade. Enquanto o acionista do processo, que detona essas condições, recebe cada vez mais dividendos (teve de volta um de cada quatro reais imobilizados no patrimônio líquido da empresa, que, com suas controladas, tem um ativo de R$ 26 bilhões), os cidadãos que sofrem os efeitos dessa dinâmica estão cada vez mais entregues à própria sorte.” Não é o nosso intuito desejar que a Companhia Vale do Rio Doce se torne o remédio de todos os nossos males antigos e daqueles decorrentes da sua atividade nas duas décadas mais recentes. Em absoluto. O que almejamos, de verdade, é a Vale do Rio Doce como parceira de uma política de desenvolvimento que contemple o sudeste paraense na medida de suas riquezas naturais e na conformidade da esperança de seus sofridos habitantes. Porque a História da colonização regional é, sobretudo, a história de uma espoliação sangrenta e formidável das levas de trabalhadores que para cá vieram trabalhar na coleta do caucho e da castanha, nos garimpos de cristal e diamantes, depois na derrubada da floresta para a formação de fazendas, na abertura de estradas, nos garimpos de ouro, em fase mais recente, e hoje vêm atrás do sonho da terra fácil ou da irrealidade de um emprego nos grandes projetos minerários. Até recentemente, pensávamos que – municípios, governos, Vale do Rio Doce - juntos, poderíamos inaugurar uma relação nova, menos colonialista, mais justa e mais humana, fundada no debate e no acerto de prioridades e estratégias que importem na geração de trabalho, renda, educação, saneamento, qualidade de vida para nossas populações. Desta ilusão nada mais resta. O DESENVOLVIMENTO REGIONAL INTEGRADO Uma verdadeira política que contemple os interesses das regiões Sul e Sudeste do Pará deve ter como prioridades: 1. Infra-Estrutura: Incentivar o sistema de transporte intermodal, aproveitando as vantagens locacionais de diferentes modalidades, priorizando o sistema hidroviário; Ampliar a participação de representantes da sociedade civil organizada, especialmente daqueles de comunidades locais, na elaboração de termos de referência das grandes obras de infra-estrutura, bem como no acompanhamento dos estudos de impacto ambiental e na avaliação dos relatórios de impacto ao meio ambiente necessários à sua implementação. 2. Incentivos econômicos: Criar incentivos pra atividades econômicas como o ecoturismo, lazer, pesca esportiva, objetivando a valorização dos recursos naturais e assegurando baixo impacto ambiental. Incentivar a modernização do parque industrial madeireiro e agroindustrial, possibilitando acesso a créditos específicos com carências adequadas à realidade do setor. Apoiar a criação de um fundo privado para viabilizar processos tecnológicos que otimizem o uso dos recursos naturais e minimizem desperdícios. Inserir a variável ambiental nos procedimentos de concessão de crédito. Criar linhas de crédito com recursos dos fundos constitucionais a juros compatíveis com a capacidade de retorno para: a) empresas agroindustriais e madeireiras para aproveitamento de resíduos; b) modernização da cadeia produtiva da indústria e agroindústria; c) viabilização de processos tecnológicos que otimizem o uso dos recursos naturais e minimizem desperdícios; d) reflorestamento e recuperação florestal com a flora regional. 3. Planejamento Estratégico: Considerar as demandas dos extrativistas, pescadores artesanais, artesãos, comunidades indígenas e agricultores familiares no Plano de Desenvolvimento do Pará, reconhecendo o desenvolvimento sustentável como um novo paradigma e tendo como um de seus eixos o modelo de reforma agrária ambiental. Incentivar a participação das instituições de ensino, pesquisa e extensão florestal na elaboração e execução da política de desenvolvimento estadual e regional. Consultar as comunidades que poderão ser afetadas por projetos que envolvam grandes investimentos e recomendar que sejam participativos e com representação das organizações de base dos segmentos afetados. Implementar programas e projetos que contribuam para geração de trabalho e renda e desenvolvimento sustentável da população regional. 4. Zoneamento Econômico-Ecológico: Elaboração do Zoneamento Econômico-Ecológico (ZEE) detalhado da microrregião, com a participação do IBGE e do Ministério do Meio Ambiente. Consolidar proposta metodológica do ZEE-Pará, incluindo o estabelecimento de grupos de trabalho temáticos envolvendo instituições locais, estabelecimento de critérios de priorização das áreas a serem mapeadas, envolvimento das prefeituras e órgãos não governamentais. Estabelecer um sistema de monitoramento do ZEE. Diversificar e ampliar incentivos fiscais e financeiros para apoiar a formalização de parcerias voltadas para o planejamento e a gestão do desenvolvimento local, com atendimento ao disposto na Constituição Federal, artigo 30, inciso VIII – “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano” e artigo 182, § 1º: “A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.” 5. Criar um sistema de Ouvidoria do Meio Ambiente. a) Controle de queimadas: Promover programas de controle do desmatamento e das queimadas. Estabelecer de forma participativa, regras de prevenção contra acidentes com fogo, incluindo-as nos instrumentos de políticas setoriais. Planejar ações de prevenção de incêndios baseadas em modelos de previsão e concentração de esforços, em atividade contínua, nas áreas de maior risco. Estimular iniciativas das comunidades que desenvolvem uma prática de exploração agrícola sem uso do fogo, o que permitirá uma significativa diminuição do desmatamento e queimadas. b) Recuperação de áreas degradadas: Promover a recuperação de áreas degradadas, inclusive em áreas de reforma agrária, visando sua reincorporação ao processo produtivo. Permitir e estimular a recuperação de áreas degradadas com o plantio consorciado de castanheiras (Bertolletia Excelsa) para a produção de amêndoas, a partir de mudas fornecidas pela Embrapa (que desenvolveu clones específicos para áreas degradadas e de produção em curto prazo), e outras essências florestais nativas. Evitar a formação de áreas degradadas, com crédito às culturas perenes e linhas de crédito que incentivem o plantio consorciado de essências florestais nas culturas agrícolas. c) Ciência e Tecnologia: Fomentar pesquisas aplicadas, com resultados mais imediatos, visando à geração e difusão de informação e conhecimento dos sistemas ambientais. Fortalecer e ampliar a infra-estrutura de pesquisa e ensino, mediante a elevação da capacidade instalada em laboratórios, equipamentos, bibliotecas e serviços de informação científica e tecnológica. Apoiar pesquisas nas universidades, nos centros públicos de pesquisas, nas ONGs e nas empresas privadas, para desenvolver e difundir tecnologias alternativas para exploração DESENVOLVIMENTO LOCAL - ALGUMAS PROPOSTAS No Sul do Pará, Marabá é o principal agente de desenvolvimento regional. Esta condição obriga-o a ter um conjunto de políticas públicas que seja um referencial para os municípios da sua área de influência. Deve, em razão disso, tomar iniciativas na formulação de projetos de desenvolvimento local e que seus efeitos na melhoria da qualidade de vida da população sejam, de fato, positivos. Neste sentido, pode-se apontar inicialmente os critérios e os espaços de negociação que – ao levar em conta a realidade específica do município - impulsionam o desenvolvimento local e propõem soluções para seus problemas: 1. O papel do governo local seria de agente articulador, indutor e catalizador de ações assumidas pelo setor privado, trabalhadores e entidades da sociedade civil. Para isso, a prefeitura deve criar um corpo de técnicos que coordenem a elaboração – feita juntamente com as representações da sociedade civil – do plano de desenvolvimento, além de acompanhar sua execução. 2. Para produzir um plano de desenvolvimento é necessário elaborar socialmente um diagnóstico da pobreza e da exclusão social e propor medidas para sua superação. A Lei Orgânica do Município dispõe sobre uma quantidade expressiva de Conselhos Municipais que devem ser vitalizados ou revitalizados com a participação das entidades representativas dos distintos setores da sociedade – sindicatos, associações de moradores, universidades, associação comercial, igrejas etc – para a discussão dos problemas e articulação das iniciativas. 3. O eixo de promoção do desenvolvimento é o de aumentar as possibilidades de emprego e melhorar a renda dos cidadãos. A partir desses critérios, muitas iniciativas são possíveis. Elas dependem da criatividade e do empenho da comunidade, apoiada pelo governo municipal. Destacaremos algumas delas: A) Dinamização das atividades rurais em torno da agricultura familiar, orientando os pequenos agricultores para culturas mais apropriadas. Horticultura e culturas temporárias associadas a culturas permanentes, por exemplo, podem renovar a economia municipal e reduzir o desemprego. B) a identificação de novos espaços de atividades econômicas, como pontos turísticos no campo, melhor aproveitamento das atividades chacareiras e a pesquisa da biodiversidade, abre inúmeras oportunidades para novas atividades. C) A formação de empresas sociais baseadas na associação de pessoas físicas que juntam os seus recursos para formar empresas sociais tem sido apoiada pelo Sebrae e se revelado uma importante alternativa para a geração de trabalho e renda. D) programas de investimento na infra-estrutura municipal envolvendo um grande número de obras simples, como drenagem e construção de escolas, podem absorver mão-de-obra pouco qualificada. Com suporte técnico e acompanhamento, tais programas absorvem desempregados e melhoram a qualidade de vida dos mais pobres. E) promoção de atividades comunitárias, como a construção de habitações por mutirão. A produção de materiais básicos – tijolos, telhas, placas de sinalização – pode também gerar empregos e oferecer produtos de baixo custo. F) Linhas de crédito para profissionais autônomos, micro-empresários e cooperativas de produção e de serviços, podem gerar atividades econômicas importantes e renda. G) Eliminação de intermediários e facilitação da relação direta entre produtores e consumidores. Instituição da feira do produtor agrícola, espaços públicos de venda de artesanato e cooperativas de prestadores de serviços apoiados pelo governo municipal, são igualmente boas alternativas. H) Abertura das licitações públicas municipais para micro e pequenas empresas visando o fornecimento de produtos e serviços como aquisição de material de limpeza ou pequenas reformas de escolas. I) Cursos de capacitação profissional que permitam aos cidadãos excluídos assumirem uma ocupação que lhes garanta um modo de vida digno. Bibliografia Agenda Positiva da Amazônia. Câmara dos Deputados, Brasília, 2001. Diagnósticos das Mesorregiões Paraenses. UFPA, pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento, Belém, 2003. Políticas municipais de emprego. Artigo de Ladislau Dowbor e Silvio Caccia Bava, publicado na Revista Polis nº 25. Instituto Polis, São Paulo, 1996. Jornal da ABONG, órgão da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais. Agosto de 1996. Lei Orgânica do Município de Marabá, revista e atualizada. Câmara Municipal de Marabá, 2002. [1] Agenda Positiva da Amazônia. Câmara dos Deputados, Brasília, 2001, p.85 [2] Agenda Positiva da Amazônia. Câmara dos Deputados, Brasília – 2001, p.85. [3] Segundo dados do IBGE – Censo 2000, os 39 municípios da mesorregião possuíam 1.044.992 habitantes em 1996, que saltaram para 1.191.244 em 2000. [4] “No caso específico do Pará – diz a justificativa da Universidade – as iniciativas dos governos estadual e federal, configuradas nos chamados eixos de integração e desenvolvimento, configuram para o Estado oportunidades promissoras para a intensificação do desenvolvimento econômico, ao mesmo tempo em que o fluxo migratório em busca de novas oportunidades poderá dificultar o programa de desenvolvimento esperado e projetado, tendo em vista os altos investimentos que serão demandados das três esferas de governo em políticas públicas, para atender às necessidades dessa população. Tais ações influenciarão, de maneira significativa, a taxa de urbanização das cidades abrangidas, exigbindo iniciativas no sentido de atenuar os problemas sociais que advirão pela demanda de serviços públicos.”

terça-feira, 15 de maio de 2007

Razões do coração

Mãe Ana Valente passava o dia inteiro no trabalho. Na beira do rio, desde as horas primeiras da manhã – quando o Itacaiúnas ainda cochilava envolto num lençol de brumas – afundava-se ela entre as trouxas de roupas alheias, que as fazia alvas e cheirosas no quaradouro de macela e folhas de melão-são-caetano. Engomava-as à tarde, no ferro a carvão de lenha, de pé na cozinha, entre panelas de mungunzá e café forte, quente, que vendia aos operários da oficina mecânica Leobaldo Santos. O pai, Valdemar, esse, meu Deus, sumia todos os meses de inverno nos castanhais, sozinho nas “colocações”, como se chamava um buraco qualquer na floresta à margem de um igarapé sem nome. Desafeito a parcerias, solitário e silencioso por natureza, Valdemar tinha os olhos muito azuis, da cor do mar de que falava tanto e que só conheci em adulto, muitos anos depois, quando, à força dessas lembranças, atirei-me ao mundo para conhecer não só o mar, meu maior encanto. Enterrava-se meu pai nos garimpos do Tocantins mal chegava o verão. Dos pedrais trazia xibius, uns diamantezinhos encardidos e misteriosos, e gaiolas cheias de pássaros da cabeça vermelha (cardeais, aprendi noutros tempos) que juntos soltávamos em festa no quintal. Das matas, no inverno, trazia Valdemar um odor inenarrável de folhas, raízes, resinas, um verde que impregnava a alma e seus olhos azuis, as castanhas escolhidas uma a uma para a lavra, a ralação na raiz rugosa da paxiba, a mãos cheias, enquanto mãe Ana socava com vareta as bagas do cupu na própria casca. E vinha o fruta-pão cozido em água e sal para o café da manhã; e vinha o frutão mais doce que açúcar, e vinham o jabuti e as carnes de sol cheirosas do porcão do mato e de outras caças. Por onde andam Edgar Valente, tio Bena, Ulisses Pompeu, Zé Pretinho, Mãe Geralda, dona Tomazinha, a viúva Itália Domingues, que contava histórias de trancoso para nosso encanto? Cadê seu Elpidinho e seus caniços de bambu e seu cachimbo de taquara eternamente preso ao canto da boca? Desceram todos o rio das memórias... Para onde foram os milhares de trabalhadores que subiam em bandos como pássaros para os castanhais e lá morriam também como aves de arribação? Viraram seres encantados da floresta... Na lembrança mais antiga, já meu irmão Donato está atrás de um torno mecânico, as mãos grandes de adolescente engrossadas no cabo de ferramentas, no apuro da freza. Na minha infância eram todos mestres: mestre Amaral, mestre Leobaldo, mestre Rosa, mestre João do Padeiro, mestre Roque, mestre Alexandre, mestre calafate Balbino... Na beira da forja era só mestre Ferreiro, qualquer que fosse ele, como se não tivesse nome de gente. Trabalhava-se muito na casa em que nasci. Havia uma espécie de obsessão furiosa com o sustento da família. Donato trocara os estudos pelo trabalho desde menino. Valdemarzinho, meu pai, embora produzisse centenas de hectolitros de castanha a cada safra, em proporção dobrada crescia o débito no armazém. Mãe Ana juntava moedas num cofrinho de madeira, lavava e passava, vendia café e mugunzá, criava galinhas no quintal. Tudo uma tarefa sem fim. Magro e elétrico, cresci em disponibilidade. Primeiro para os livros, os gibis - que eram lidos, trocados, relidos, e os desenhos do Cavaleiro Negro exaustivamente copiados num caderno de arame. Depois os primeiros contos machadianos, a poesia telegráfica em letra miúda, escrita a qualquer instante, voraz como aprendiz de alquimia; e o jazz da Voz da América ouvido num rádio Transglobe Philco, alta madrugada, bem baixinho para não acordar os pais e o irmão cansados.; Por fim, os cigarros com os amigos igualmente desgarrados nas manhãs de pura luz. E que felicidade as peladas no Granito, o campinho, ainda hoje uma porção geográfica de liberdade enclausurada entre a última rua e a margem do rio Itacaiúnas, e o banho em algazarra saltando das árvores, as passarinhadas na cachoeira do Pirucaba, rio acima, a pesca em cestos de vime quando as primeiras águas do inverno estouravam a Grota Criminosa, que passava quase dentro da cidade, e por onde voavam cardumes de traíras contra a correnteza! Entre julho e setembro, atravessávamos o rio a pé e a nado, a água pela cintura, rumo aos cajuais da Colônia Quindangues. Certa vez alguém levou uma garrafa de cachaça Vale, jóia de Igarapé Miri, umas pitadas de sal, limões, e conheci os vômitos iniciais, o mal-estar do mundo à roda da cabeça. Escolas diferentes pela manhã e à tarde. Cheguei a ser matriculado até em aulas noturnas com o prof. Farias, um senhor linfático, anelão de prata na mão direita. Com aquela arma, Farias costumava deixar galos na cabeça dos menos comportados. Também cedo me puseram na velha oficina mecânica do mestre Leobaldo, entre motores de popa de fabricação sueca, jurássicos tornos mecânicos, tenebrosas forjas de refundir sobras de metais e os arcanos mistérios da recriação de formas, perfis, lingotes, barras que viravam peças de insonhadas arquiteturas. Grande sacada de mãe Ana, essa de por-me na oficina para aprender ofícios e responsabilidades! Ali, na oficina, havia um sentido novo de vida, amigos mais maduros, ruídos que aprendi a identificar de olhos fechados, cores e texturas, a fala e o riso de cada mestre e aprendiz, a canção da serra circular conforme a densidade da madeira, a luz inolvidável do acetileno e a magia da fusão do ferro e da solda, o formato sextavado das marretas de malhar ferro em brasa que eu não conseguia levantar de tão pesadas. No sábado, o dinheirinho gratificante entregue à mãe, que o regrava para o ingresso no cinema, a muda de roupa, o sapato do colégio. Mas, fora da algazarra, os livros e o silêncio. Em tudo isso havia uma tranqüilidade única e a convicção de que esta seria a ordem das coisas, a regra do mundo, sem qualquer dor. Dia desses um amigo perguntou-me como virei poeta. Eu não sei. Só sei que assim nasceu a poesia. Justo quando a solidão estava definitivamente instalada entre o menino e o mundo. P.S. - Esta crônica já tem idade. Mas no domingo, 13 de maio, fui ao cemitério de São Miguel rever o túmulo coletivo da família (amados pai, mãe, tia e sobrinho), cercado de alguns dos meus amigos de infância e de pioneiros desta cidade sem memória, e as lembranças e saudades foram tantas que resolvi desencavar esta declaração de amor e de saudade.