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sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Sobra de ouro: a novela sem fim

Ainda nos anos 80, a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp) moveu Ação Ordinária de Cobrança, na 7ª Vara Federal, em Brasília, contra a Caixa Econômica Federal, para o recebimento do equivalente a 901 quilos de ouro, como sobra dos 400 primeiros lotes comprados pela instituição bancária no garimpo de Serra Pelada naquela década. A preço corrigido, o crédito na Caixa Econômica Federal ascende hoje a algo em torno de R$ 220 milhões, enquanto as dívidas acumuladas da Coomigasp apenas com 78 credores seriam superiores a R$ 120 milhões. O pagamento desse dinheiro virou uma novela. Durante seis meses, em 1997, milhares de garimpeiros acamparam na praça central da Marabá Pioneira, em frente à sede da Caixa Econômica Federal, pressionando pela liberação desses milhões de reais, exigindo que o pagamento fosse feito diretamente a eles e não à cooperativa, que teria se valido de meios fraudulentos para substituí-los na ação indenizatória. Os garimpeiros nada conseguiram. A Lei 7.599, votada e aprovada a toque de caixa em 1987, obriga o Banco Central, por meio da CEF, a aplicar os recursos resultantes das sobras de ouro, paládio e prata em obras destinadas a melhorar a produtividade da garimpagem manual. Enquanto isso, a execução judicial foi paralisada por determinação da 7ª Vara Federal, e à época a Coomigasp também acionou s comarcas de Marabá e Curionópolis para anular “penhoras fraudulentas, “oriundas de atos ilegais de diretorias anteriores”, no valor aproximado de R$ 52 milhões, que enquanto não forem canceladas nenhum valor será pago pela CEF. Entre as penhoras irregulares estaria a cobrança superfaturada de R$ 15,799 milhões feita pela empresa Norte Transportes Rodoviários por serviços de rebaixamento da cava em Serra Pelada, e nota promissória de R$ 17,346 milhões em nome da Reis Factoring Ltda., empresa do Distrito Federal, que já teria falido e seus diretores não encontrados. A quantas andam tais processos? Em 1998 dizia-se que a CEF, condenada a pagar o valor corrigido da sobra de ouro, alegou que não poderia ser responsabilizada sozinha porque apenas cumprira ordem do Banco Central. Logo, faltava o BC no processo como litisconsorte passivo necessário. Em conseqüência, o processo teria sido devolvido para a comarca de Curionópolis, após mais de 20 anos de tramitação, para que seus autores propusessem a chamada do BC à lide. Pelo andar do Judiciário, é bem provável que a questão leve outros 20 anos para chegar a termo. Na semana passada, informa o Diário do Pará (29/11), durante audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias para tratar deste assunto, a CEF negou estar se esquivando de repassar aos garimpeiros os recursos relativos à venda das sobras de ouro, paládio e prata, mas pretextou que a questão está sub judice e que “a preocupação da CEF é que os recursos cheguem aos garimpeiros e não a entidades que não tenham legitimidade de representá-los”. Ora, é surpreendente essa preocupação da Caixa com que venham a fazer os garimpeiros com o dinheiro que lhes é devido... No dito encontro, soube-se que foi o Ministério Público Federal que pediu a suspensão da execução de sentença (do pagamento da dívida) porque a cooperativa é alvo de ações trabalhistas, de indenização e de cobrança, e o dinheiro é repassado diretamente para as pessoas que têm penhoras dentro do processo. E que a existência da agora Cooperativa Nacional dos Garimpeiros de Serra Pelada (Congasp) está sendo contestada judicialmente. Enquanto isso, garimpeiros sexagenários perdem a paciência no garimpo e a insatisfação arde como fogo de monturo, manifestada em assassinatos, disputa entre supostas e divergentes lideranças e organizações garimpeiras.

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