Pages

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Imunes e impunes: por que os reelegemos?





Se o Brasil é ainda um Estado laico e o principio de separação entre Estado e religião é operativo, qualquer análise deve passar, necessariamente, pela pergunta: no que consiste a moralidade política atual? Diante do problema levantado por Dostoiévski, “se nãoum Criador, tudo seria permitido”, uma das mais comuns argumentações é que a ética pode prescindir da metafísica. Vale dizer, pode-se ser honesto, correto e politicamente elegante, sem apostar nos valores transcendentes.
Então, qual seria o norte ético? Ouve-se que devemos ser éticos porque essa é a natureza humana. Nada mais falso. A maioria não apresenta traços de fervor altruísta inato. Diante do pleno sucesso do darwinismo social veremos que os homens não nascem com desejo de ceder a vez na fila, dividir suas fortunas, ou sacrificar-se pelos irmãos. Engana-se, rouba-se, humilha-se, tripudia-se, insulta-se e locupleta-se todos os dias. Seremos ladrões potenciais à espera de oportunidades? Talvez. Queremos ganhar a qualquer preço? Certamente. Mas há uma espécie de sistema autorregulador interno que nos auxilia, e faz com que tenhamos algum poder sobre nosso desejo de supremacia.
Renunciamos a alguns traços muito humanos para sair da barbárie e aderir ao processo civilizatório. Foi necessário domesticar o instinto predadorclaro que as tradições espirituais e culturais influenciaram nesta supressão — para fazer nascer um embrião solidário, as liberdades civis, o aperfeiçoamento da democracia etc. O problema é que, abandonando o feto à própria sorte, estamos retrocedendo. Veja-se a prerrogativa jurídica chamada de “imunidade parlamentar” e “foro privilegiado”, coisa muito nossa. Além de aberração, esse sistema foi inventado para proteger quem vai cometer falta. Legitima e institucionaliza a desigualdade entre cidadãos. Há maior demonstração de “impunidade preventiva” que essa?
Somos invadidos pela perplexidade na infindável confusão entre público e privado. É corrupção generalizada, ou aumento da transparência? Quem controla quem? Quem controlará os controladores? Como sair deste enredo vicioso, e ao mesmo tempo não cair na armadilha moralista que costuma enxergar a falta alheia? Sim, mas é claro que a culpa nos cabe.
Nãosaída a não ser reexaminar a combalida, moribunda e insepulta palavraética”. Segundo o dicionário, o termo deriva etimologicamente do grego ethikós, que significa “ramo do conhecimento que estuda a conduta humana, estabelecendo os conceitos do bem e do mal, numa determinada sociedade em determinada época”.
Assim colocado, sabemos que Heróphilos (4 a.C) tinha respaldo para praticar vivissecções em prisioneiros, a posse de escravos foi defendida publicamente por Aristóteles. Para os legisladores da Santa Inquisição, os índios eram seresdesprovidos de alma” e as Leis de Nuremberg da Alemanha nazistaberço dos parâmetros arianos — foram obsequiosamente seguidas como norte moral pelo povo alemão. Assim a ética de cada época é de aterradora flexibilidade. Como o futuro nos julgará pelos critérios éticos adotados hoje
Além do juiz que cantou que não poderia ler os autos, agora temos o ex-novo ministro Mercadante que recentemente anunciou quemuitos morrerão pelas enchentes”. Ora, ora, parece até que combinaram, e estão todos se eximindo por antecipação. Pois alguém deveria avisá-los que é deles ( que parece não ter nenhum interesse em uma sociedade civil forte e organizada) a prerrogativa de adotar todas as medidas preventivas possíveis. Pois, se a mídia silencia, temos bem guardadas as imagens das cidades serranas e vítimas soterradas no estado do Rio.
Houvesse qualquer decoro e um parlamento móvel virasse o país do avesso, em dias uma comissão extraordinária seria criada para resolver  condições estruturais ainda deploráveis no Brasil: educação, saúde/desnutrição e segurança. Por isso mesmo, não bastam cursos de administração pública, PACs ou economia aquecida, e são insuficientes slogans ou juramentos solenes sobre programa partidários. É necessário que a vocação política seja reinventada à luz do talento para trabalhar pelos outros.
Se o Estado realmente funcionasse, ninguém mais se importaria com auxilio-camareira, ajuda-vestuário ou patrocínio-moradia. O valor dos jetons poderia ser ajustado por indexadores da Bolsa, e liberar-se-iam as informações privilegiadas com direito ao uso dos dotes premonitórios às  consultorias milionárias. Estariam permitidas aposentadorias duplas além de pensões vitalícias contemplando as castas dos três poderes. O país é tão espetacular e rico que há o suficiente para tudo isso. Mas, por favor: trabalhem. É o mínimo que se pode rogar a vossas excelências.  ( Via Jornal do Brasil, Paulo Rosenbaum)

Um comentário:

Adir Castro disse...

Sinceramente falando, não acredito que através do voto a gente consiga sair do lamaçal que nos encontramos, muito menos nos livrarmos desses parasitas. Acho que a "coisa" só mudaria em nosso país mediante um grande derramamento de sangue, assim quem sobreviver saberá cobrar, dos administradores de um modo geral, pelo sangue derramado dos seus.

Todos os países desenvolvidos, com exceção do Canadá, passaram por isso para chegarem onde hoje se encontram.

Infelizmente até no derramamento de sangue é difícil confiar. Senão vejamos os líderes que no passado insurgiram contra o "sistema" e hoje estão milionários: Zé Dirceu, Jenuino... E tantos outros. Hoje fica a impressão de que eles queriam somente a fatia no bolo que acreditavam merecer.

Os verdadeiros idealistas que por ventura possam ter existido, ficaram com suas carcaças para trás e em locais ignorados... Nem uma cruz ou coroa de flores, nem um sinal para lembrá-los.

Na História de nosso país não existiu nenhum movimento sincero nesse sentido, todos foram mal intencionados: Independência do Brasil; Inconfidência Mineira, movimento exclusivamente mineiro e que a época visava fazer de Minas Gerais, o estado mais rico, um país independente, deixando a própria sorte o restante dos brasileiros, hoje é um feriado nacional; Balaiadas, Timbaladas, Cambalachos..., Proclamação da República, Nova República, Governo Militar...