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terça-feira, 23 de julho de 2013

Na briga da "elite" contra a saúde pública, dane-se a população


Mílton de Arruda Martins: Expansão dos cursos de medicina, com “elitização brutal”, pode ter ajudado a concentrar médicos





por Conceição Lemes

Hecatombe, com “feridos” dos dois lados.
Eis no que se transformou a questão da falta de médicos no Brasil, desde que, em 6 de maio, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, revelou que o governo brasileiro negociava um acordo para trazer 6 mil cubanos
Por razões principalmente ideológicas, mídia tradicional, partidos de oposição e entidades médicas a atacaram ferozmente.
Florentino Cardoso, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), “destacou-se”: “O Brasil quer trazer a escória”.
Preconceito, xenofobia, falta de honestidade intelectual. Entre os 201 cursos de medicina existentes atualmente no Brasil (57,9% privados), há os que deixam a desejar, formando médicos de má qualidade.
Cuba tem 22 faculdades de medicina. Em 2008, possuía 37 mil profissionais de saúde trabalhando em 70 países.
“Embora Cuba tenha recursos econômicos limitados, seu sistema de saúde resolveu alguns problemas que o nosso [dos Estados Unidos] ainda nem enfrentou”, avaliam dois médicos norte-americanos que lá estiveram, em artigo publicado em janeiro deste ano, numa das revistas médicas mais conceituadas do planeta, o The New England Journal of Medicine.
Apesar disso, lentamente, o recuo do Brasil em relação médicos cubanos foi se dando.
Em 14 de maio, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, informou que o governo brasileiro desejava atrair médicos da Espanha e Portugal para trabalhar em hospitais localizados em regiões carentes no Brasil.
O ministro esqueceu-se combinar com “os russos”. Anunciou a estratégia sem ter tido, ao menos, a delicadeza, de conversar antes com os governos e as entidades médicas de Portugal e Espanha. Indignado, o presidente de uma instituição portuguesa reagiu: “Quem disse que nós vamos!”
Em 21 de maio, Padilha disse que não traria médicos da Elam (Escola Latino-Americana de Medicina), de Cuba.
Por má-fé, a imprensa transformou Elam em Irã e descartou totalmente a vinda dos cubanos. A restrição expressa era apenas à Elam, cujo curso de medicina dura quatro anos, o do Brasil, seis.
Em 5 de junho, com o clima esquentando, o ministro, em encontro com entidades médicas, jogou o imbróglio em costa alheia: “Este debate  (sobre a ‘importação de médicos’) foi antecipado inadvertidamente pelo ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, ao falar sobre acordo para a vinda de 6 mil médicos cubanos ao Brasil”.
Patriota teria falado sem a anuência da presidenta Dilma Rousseff, que, em 2012, em visita a Cuba discutiu o assunto? Padilha teria levado uma bola nas costas de Patriota?
Ao se confrontar com esses dados (aqui e aqui), é difícil crer.
O fato é que, com as passeatas de junho, a falta de médicos, prejudicando a assistência à saúde, ganhou as ruas.
Em resposta, em 9 de julho, a presidente Dilma lançou o programa Mais Médicos, que prevê, entre outras medidas:  criação de 11.400 vagas nos cursos de graduação de medicina; bolsa de R$ 10 mil reais para os médicos que dispuserem a ir para regiões afastadas do País ou para periferias das grandes cidades; e a contratação de médicos estrangeiros, caso as vagas disponíveis não sejam preenchidas.
Estamos em 21 de julho e a queda de braço prossegue, em temperaturas cada vez mais altas.
As entidades médicas, por questões corporativas e de reserva de mercado, continuam batendo na surrada tecla: não há falta de médicos no Brasil, o problema seria a má distribuição. O que não é verdade.
O governo, por sua vez, se atrapalha com decisões atabalhoadas, midiáticas.
Em vez de buscar uma solução efetiva, duradoura, capaz de efetivamente fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS), recorre a uma saída meia-boca.  A bolsa de R$ 10 mil para os médicos não tem garantia trabalhista. É precarização do trabalho.
Já a população das áreas mais carentes do País — seja das regiões ou das periferias das grandes cidades — não pode ficar desassistida. De jeito nenhum. Muito menos à mercê de disputas, picuinhas, sabotagens e manipulações.
Não é um Fla-Flu que está em jogo. É assistência à saúde de milhões de brasileiros. (Leia muito mais em   VIOMUNDO)

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