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domingo, 8 de abril de 2007

Marabá: esta terra!

È isto mesmo! Esta terra é vista pelas suas mais diversas formas e aspectos que saltam aos olhos de seres viventes que aqui residem ou por aqui passam. É exaltada por múltiplos sentimentos, desde os utilitaristas aos saudosistas e ufanistas, os céticos, idealistas, oportunistas e lúcidos. Vou tentar expressar minha visão a partir de um destes sentimentos, o que mais me influencia neste momento, de tanta insegurança sobre o agora e o futuro, e sentimento de medo, é, o medo de não podermos avançar no sentido do progresso da humanidade e voltarmos ao estágio de barbárie. Aqui, viveu-se por quase um século sob as ordens dos mais fortes, mais poderoso, proprietários das terras, donos do dinheiro que garantia o aviamento e a geração de riqueza para poucos. Famílias privilegiadas pelo apoio político e comercial que vinha da metrópole. Este modo de exploração começa a ser ameaçado no final da década de 60, com o anuncio da descoberta da reserva do minério de ferro de Carajás. È abalado e quase destruído na década de 70, com abertura das rodovias Transamazônica e PA-70, que possibilitaram o contato do povo desta região com a capital do Estado e com outros Estados. Desde então, aos dias de hoje, são pouco mais de trinta anos, de muitas transformações experimentadas pelos povos deste município. Foram-se as forças dos garimpos de diamante, que embora os garimpos fossem em outros municípios, as relações de poder se construíam aqui. Foram-se os castanhais, os castanheiros (cortadores de castanha), os barqueiros (porcos d’água), os tropeiros, os mariscadores, os marreteiros. Foram-se também muitos de seus algozes, embora alguns resistam, porque são duros para morrer, mas o dia chegará. Surgiram outras frentes: a agricultura (de subsistência), a pecuária, a exploração madeireira, as cerâmicas, as mineradoras, as guseiras, cultivo de soja e de eucalipto. São outras relações de poder e dominação que disputam a hegemonia do espaço, com táticas as mais diferenciadas, embora as estratégias em muitos casos sejam as mesmas. Mas por trás de tudo isso, nesta terra, se desenvolve um mundo oculto, no campo e na cidade: do autoritarismo, do monopólio, da corrupção, da miséria, da pobreza, da exclusão, da exploração, da espoliação, da degradação, da destruição, da morte imatura e da morte em vida em que muitos se encontram. Este mundo oculto poucos o percebem e muitos se fazem não perceberem. É um mundo de situação perversa, mas para os que se favorecem deve ser mantido porque garante a geração de riqueza para os poucos e garante o estado de poder e dominação, que é gerado no setor público e privado. Posso até estar enganado, mas é assim que vejo esta terra: de muita riqueza material mas de muita gente pobre econômica, política, intelectual e moralmente. “...morreu quase todo bicho/esvaiu-se todo encanto/visagem caiu no mato/-pernas para que vos quero?-/passarinho foi embora/dizer para onde não sei;/só ficamos nós,coitados,/preso no arame farpado/bando de bois./calcule a tragédia” ("Esta Terra", Ademir Braz, 30/31 de agosto de 1978). Vamos à luta! Raimundo Gomes da Cruz Neto (rgc.neto@yahoo.com.br)

5 comentários:

Anônimo disse...

mundico, tu não citou correto: não é "...bando de bois entre bois...",o final do poema do Pagão?
Acho a figura de linguagem interessante: todo mundo é boi!!
mansos, cordatos, pacíficos e chifrudos!!! Prontos pro abate!
jycc

Anônimo disse...

...Existe uma grande quantidade de mediações entre a ação individual e a síntese social que permite construir e/ou identificar um sujeito coletivo. Entretanto, desentranhá-las é parte de uma tarefa também coletiva.
Para Gramsci a essência da concepção do mundo está na vida cotidiana, na relação concreta e específica dos trabalhadores...
Ana Esther Ceceña - Cientista Social(México).

O “quase” é o destaque do poema de Ademir Braz. Parabéns ao texto de da Cruz Neto.
Bjs.

Ademir Braz disse...

O jycc está certo, Neto. Mas o importane mesmo é a discussão dos problemas locais e regionais.
Não vejo como nos tornarmos estado (carajás é nome horrível!)sem mudar o perfil de conflitos que nos tem caracterizado até aqui. Ou seja, não podemos deixar para depois, o que precisa ser repensado desde décadas.
Obrigado aos dois pela visita.

Ademir Braz disse...

Oi, Cris:
O Neto é uma das nossas melhores cabeças. jycc também. Fico feliz que Quaradouro os tenha motivado e a nossos leitores.

Anônimo disse...

Mundico, possa parecer preciosismo, mas considero o poema citado como o nosso "canto do cisne", Pagão, até mesmo inconscientemente ou não, captou o poema toda a nossa tragédia no momento mais triste de nossa estória local (transmazônica, violência, ditadura, pro-tempores, área de segurança nacional, terror, etc). O poema dele foi a única resistência que àquela época conseguimos esboçar, através da sensibilidade incomum do poeta. Há anos estudo este poema e um dia - quem sabe? - devo fazer minhas considerações. Viva o poeta!
jycc