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sexta-feira, 25 de julho de 2008

Quem foi seqüestrado?

É com muita estranheza e até indignação que recebi a noticia de que o nosso advogado José Batista, da CPT. e o ex-coordenador Nonato, da Fetagri, foram condenados a dois anos e cinco meses de prisão. Motivo: teriam, eles, organizado um “seqüestro” dos negociadores do Incra quando aconteceu um acampamento de mais de cinco mil assentados na Agrópolis Amapá, em 1999. Não quero aqui discutir o mérito do absurdo da condenação. A sociedade civil de Marabá e a OAB local já se manifestaram na imprensa contra essa estranha decisão. Eu gostaria discutir o mérito do seqüestro. Estavam lá, dentro do Incra, famílias de assentados com suas organizações, para negociar a Proposta Orçamentária (P.O.) do ano; essa negociação acontece todos os anos, a fim de discutir um planejamento das verbas do Incra alocadas para os créditos dos assentamentos e das questões fundiárias. Lembro-me muito bem que já fazia mais de duas semanas que tinha iniciado o acampamento: todos esperavam o bel-prazer dos negociadores do Incra chegarem de Brasília. Enfim, no vigésimo dia essa tão esperada comissão chegou. Depois de um meio-dia de negociação e sem ter esgotada a pauta de discussão, essa comissão, alegando não ser autoridade de negociação, informou que voltava para Brasília para comunicar às autoridades competentes os pontos da pauta e para elas tomarem os encaminhamentos necessários. Surpresa geral dos acampados, inclusive de uns diretores da Fetagri, da Contag e do MST, que acompanhavam as negociações! Os acampados decidiram então de que ninguém saía da sala de negociação sem ter dado os devidos encaminhamentos. Isso que é chamado de cárcere privado? Quem estava em situação de seqüestro nesse caso? Respondo eu: não seria a mulher grávida do assentado que não tem posto de saúde? Não seria o jovem que não tem escola depois da 4ª série? Não seria a produção do assentado que não tem por onde escoar porque não tem estrada? Se fosse para listar aqui os motivos de situação de seqüestro em que se encontram os assentados seria necessário um jornal inteiro! Os assentados estavam no Incra porque queriam gritar contra a situação de seqüestro endêmico e crônico em que se achavam. Os responsáveis por esse “seqüestrão geral” levaram vinte dias para se apresentar nas negociações deixando os assentados seqüestrados dentro do próprio acampamento. cansados e abusados, os assentados fecharam as portas do auditório onde ocorriam as negociações, porque a comissão de negociação queria ir embora. Alem disso, os acampados divulgaram, para todos saberem, o que estava acontecendo: a comissão só sairia da sala com planejamento estabelecido. É seqüestro quando todo mundo sabe onde ficam os “seqüestrados”, inclusive a policia que estava lá? É seqüestro quando seqüestradores e seqüestrados vivem as mesmas condições? Não faltaram água e comida nem, até, ar condicionado. Tomara que o zelo da Justiça em condenar Batista e Nonato tenha a mesma rapidez e eficácia do que em procurar os assassinos e mandantes dos quase 500 assassinatos dos camponeses da nossa região do Sul-Sudeste do Pará. Porque se continuar desse jeito, os chacinados da curva dos “S” serão desenterrados para cumprir vários anos de prisão, pois falta pouco para concluir que são os mortos que são os responsáveis e serão condenados por suicídio coletivo! E ainda, Senhor Ministro Gilmar Mendes, como ficam as quadrilhas do Daniel Dantas, do Naji Nahas e do Celso Pitta? Se Batista e Nonato forem cumprir a determinação da prisão, “todos os seqüestradores” daquele acampamento vão se sentir na obrigação de acompanhá-los e de cumprir também a ordem de prisão. Haja cadeia! Em 14 de julho, festa da Tomada da Bastilha, início da revolução francesa em 1789, foi onde nasceu a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aquela de que “todos são iguais perante a lei....”. Hoje, contudo, parece que uns são mais iguais do que os outros. (Emmanuel Wambergue, presidente da Copserviços)

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro Mano,

só mesmo neste quaradouro de almas é que eu poderia reencontrá-lo depois de tanto tempo.

Que boa surpresa.

Um grande abraço.

Adelina