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quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Assombração

Morreu a matriarca de tradicional família de São Domingos das Latas e seus herdeiros decidiram dar-lhe uma despedida digna. Um dos filhos, fazendeiro, partiu cedo para Marabá em busca da melhor urna funerária que encontrasse. Encontrou-a na Cidade Nova, caríssima, mas ele não reclamou. Aproveitou e comprou logo todos os adereços: cruz de madeira, coroas de flores, velas, e alugou os apetrechos metálicos para o velório. Tudo em ordem, os homens da funerária colocaram a urna brilhante e pesada na carroceria de camionete e as peças no banco do carona. Descendo na direção da Nova Marabá, pouco antes da cabeceira da ponte do Itacaiúnas o fazendeiro freou para atender o cidadão que lhe acenava. Era um vizinho e amigo que há mais de semana tinha vindo à cidade divertir-se. E não perdera tempo, pelo visto: ainda estava bêbado; Queixou-se de estar liso e pediu carona para voltar. Ora, assim que o bêbado aboletou-se na carroceria, começou a chover e meteu-se ele dentro do caixão confortável, fechou a tampa e dormiu. O motorista ainda zanzou algum tempo pela Velha Marabá, debaixo da chuva, depois seguiu para o Km-06, onde o aguardavam seis ou oito trabalhadores que ficaram em compras de material para a fazenda. Embarcados, seguiram viagem para São Domingos na maior embalada. Mais ou menos à altura do km-12 da Transamazônica, a peãozada entreolhou-se desconfiada, alguns já com metade do corpo fora da carroceria, quando a tampa do caixão começou a mover-se. Então, quando o bêbado sentou-se de repente dentro da urna e perguntou “A chuva já passou?”, ninguém lhe respondeu. Dizem que até hoje tem gente perdida nas matas do Taurizin. (Histórias marabanesas, inédito)

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