O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, decidiu que será
julgado pela Justiça Federal em Redenção, no sudeste do Pará, o processo em que
o Ministério Público Federal (MPF) denuncia irregularidades no licenciamento
ambiental de atividades do projeto Onça-Puma, da mineradora Vale.
No final de 2012, o juiz federal Adelmar Aires Pimenta da
Silva, que atua em Redenção, havia determinado o envio do caso ao Superior
Tribunal Federal (STF). O procurador da República Leonardo Cervino Martinelli recorreu ao TRF-1
e, nesta quinta-feira, 7 de fevereiro, o MPF teve acesso à íntegra da decisão
do tribunal.
Na decisão do TRF-1, o juiz federal Carlos Eduardo Castro
Martins acata os argumentos do MPF, considerando que o caso não apresenta
conflito federativo. “Além da controvérsia travada nos autos de origem não
contrapor interesses de entes estatais, na medida em que não se pode confundir
a instituição Ministério Público com a pessoa jurídica União, a lide ali
instaurada não representa qualquer potencial ofensivo ao pacto federativo”,
registra a decisão do TRF-1.
O juiz federal em Redenção havia considerado que, como o MPF
é um órgão da União, teria provocado um conflito federativo ao acusar o Estado
do Pará de praticar irregularidades na expedição de licenças ambientais para
exploração mineral. Para o procurador da República Leonardo Cervino Martinelli,
essa interpretação foi exagerada.
“Da análise da jurisprudência, extrai-se que a
caracterização do chamado 'conflito federativo' demanda não apenas a existência
de litígio entre aqueles entes (União, Estados, Distrito Federal e as
respectivas entidades da administração indireta), taxativamente previstos no
dispositivo constitucional em questão, mas também que tal litígio possa
importar seja em potencial desestabilização do próprio pacto federativo, seja
em potencial quebra do equilíbrio harmonioso das relações políticas entre as
pessoas estatais que integram a Federação brasileira", argumentou o
procurador da República no recurso ao TRF-1.
Histórico processual – Em maio de 2012, o MPF ajuizou ação
civil pública contra a Vale, a Secretaria de Meio Ambiente do Pará (Sema) e a
Fundação Nacional do Índio (Funai) pedindo a suspensão imediata das atividades
da Mineração Onça-Puma, empreendimento de extração de níquel da Vale em
Ourilândia do Norte, no sudeste do Pará, até que sejam cumpridas as
medidas de compensação e redução dos
impactos sobre os índios Xikrin e Kayapó.
O MPF também quer a condenação da Vale ao pagamento de todos
os danos materiais e morais causados aos índios desde maio de 2010, prazo em
que o empreendimento funcionou sem cumprir as medidas compensatórias (também
chamadas de condicionantes). As indenizações devem ultrapassar R$ 1 milhão por
mês para cada comunidade afetada.
O MPF sustenta que a Sema impôs condicionantes ao
empreendimento para assegurar a sobrevivência física e cultural dos povos
indígenas afetados mas concedeu todas as licenças sem cobrar o cumprimento de
condicionantes, permitindo uma situação em que os prejuízos se concretizaram
para os índios e a mineradora recolhe os lucros sem cumprir obrigação nenhuma.
Mesmo sem cumprir nenhuma condicionante na fase de licença
prévia, a Vale conseguiu todas as licenças posteriores, e a Sema nunca cobrou o
cumprimento das condicionantes que ela mesma tinha imposto com base nos estudos
etnológicos de impacto sobre as Terras Indígenas Xikrin do Cateté e Kayapó.
A Funai também é ré no processo porque demorou quase cinco
anos para emitir um parecer sobre os estudos de impacto, que era necessário
para dar andamento aos programas de compensação ambiental. Enquanto a Funai
permanecia inerte, a Vale foi obtendo todas as licenças da Sema e o projeto se
iniciou sem nenhuma garantia aos índios.
Os estudos, feitos pela própria Vale e aprovados pela Funai
com enorme atraso enumeram impactos severos sobre a Terra Indígena Xikrin do
Cateté, onde vivem cerca de mil índios: pressão de invasões sobre o território
indígena, risco de contaminação no rio Cateté, de onde os Xikrin tiram o
sustento, poluição sonora e do ar pela proximidade da usina metalúrgica do
empreendimento.
A Terra Indígena Kayapó, notadamente as aldeias Aukre,
Pykararankre, Kendjam e Kikretum, com cerca de 4,5 mil índios, também é afetada
pela mineração de níquel da Vale, principalmente pelo fluxo migracional que
gera pressão de invasores e madeireiros sobre a terra, diz a ação do MPF.
Desde agosto de 2008 já está ocorrendo o decapeamento do
minério, lavra e formação de pilhas de estéril e minério no projeto, que fica
bem ao lado da Terra Xikrin.
Para o MPF, além da obrigação de implantar os programas de
mitigação e compensação, a Vale deve ser obrigada a indenizar os índios em
valores calculados de acordo com o tempo em que as atividades econômicas estão
funcionando, causando impactos e gerando lucros sem compensação.
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