segunda-feira, 2 de abril de 2007
A arte em grãos: Jorge Luis Ribeiro
Arremedo de biografia
Nasci em Inhapim, Minas Gerais, em 68, filho de um 25 de dezembro chuvoso. Mas fui nascer de novo, mesmo, foi em Marabá, já faz tanto tempo que fiquei antigo de Rios e sol. Este é meu lugar que acolheu meus amores, amigos, abrigos e saudades. Fiz-me advogado só para experimentar desentortar leis e tentar ajudar companheiros de sonhos a regar sementes de justiça. Andei de avião pela primeira vez e vi que somos pequenos demais para tanta arrogância.
Depois fui fazer mestrado no Sul, passei frio, saudades e fui assaltado, além de trazer um diploma que guardei longe da parede. Ah, também passei por Coimbra por uns meses, vi poesias nas paredes medievais de Portugal e visitei parentes que passam frios e fomes pela parca moeda estrangeira.
Vi que o mundo se comunica mais na dor que nas glórias. Andei um pouco e reaprendi a amar nossa casa e nosso café da manhã, voltar apaixonado pra casa e pintar juntos um armário velho e expulsar cupins, plantar uma nuvem azul na cozinha.
Mas minha maior tristeza ainda é não ter tempo de andar com os pés nelas: nas nuvens...
*****
Maneiras mineiras
Morrinha de janeiro na roça.
Biscoito de polvilho que explodia com pipoca e chuva.
Moinho de café rodando café torrado com estórias
de assombração dentro de xícaras esmaltadas.
Arreio no esteio mofando de umidade da cangalha
velha rangendo de frio. Broa de milho assando rezas
de acalmar temporal com mato bento nos mistérios
do assoalho vistoriado em segredo de cômoda branca
espiando a tia solteira com seus quebráveis sonhos de guarda-louça.
Bica de imbaúba jorrando água de enxurrada tocando moinho
d'água que passa debaixo da mosca azul na privada.
Cana assada para tosse de friagem tecendo balaio de taquara
sob guarda-chuva de cabo de chifre espiando a galocha
sentada no pilão que dorme.
A mão tira com colher de pau o cheiro de rapa de angu
na fumaça de almoço com palmito de indaiá.
Chapéu molhado do Pai cuida da cuia de milho de planta
na terra estocada para arar com a junta de boi cangada.
Tempo tecendo uma colcha de retalhos colorida
na máquina de costura cros lux, Mãe,
o pedal que roda o carretel de silêncio
de goteiras de sonhos que não têm fim,
Eu.
Como assim?
Agora perdi o encalço da palavra prometida ontem
Mas não me preocupo
A merda é que as desculpas desorganizam a gente
Para o que eu sei não há emprego
Tô na rua e vou zoar aí...
Irrito as horas mascando chicletes
Colo a goma no vidro rachado
A janela do ônibus vai dar no orifício do mundo
Onde um camaleão de chicletes escorre mole
A rosa de sua cor estaciona nos olhos do meio-dia
Minha imagem quase derretida descamufla a forma
Alguém sacaneou nosso sonho, veja os pedintes!
- mundo fodido!
E ninguém faz motim
Mas eu, de boa, não estou magoado não!
É que fico também assim,
Resistindo sem atitude, entende?
Enquanto a rua
Passa por mim...
Quando a libélula faz amor com a água
Quero te amar com a impaciência das neblinas
Que aprendem a não serem mais virgens
Ter-me preso entre suas pernas e em meu corpo domada
O mapa de sua pele navegada que viajo
Aos cantos mais secretos teus
Te ver gozar com o fremir das borboletas que encontram as asas
Nem que eu te perca em teu vôo – (por um instante só!)
Janela
hoje amanheceu um pombo cinza enrolado no telhado da história
... era Coimbra
Coletivo
Os trabalhadores dentro do ônibus no fim do dia
olhos de uma vida inteira parecem velhos
olhos de um dia inteiro parecem vermelhos
sono e cansaço de um dia de trabalho
que uma vida em-batalha
os olhos parecem lesados
o corpo parece pesado
olhos de uma vida de dia-a-dia
no trabalho de um dia
o que sustentaria a loucura e a mais valia
senão o pescoço e ombros adequados
mas hoje é sexta-feira e o horizonte cai embriagado
e assim vamos todos
todos enlatados na palavra POVO
até que se ouça o grito
de todos os silêncios somados.
Conspiração
Essas velhinhas que olham o tempo das janelas altas
As ruas pontilhadas de pessoas que o tempo todo passam
Eu acho que elas conjuram um pacto de parar o tempo
E os que passam com o tempo não percebem que elas ficam...
Enquanto todos passam o tempo todo
Sobre desvelocidade intemporal da solidão
Elas suspiram um cheiro de sono
Um tempo que infelizmente não pára no interior da gente
Nelas até a luz fica estacionária nas asas de moscas vacilantes
Antes de serem de um tempo museu que move ao detrás
Elas guardam um presente que perdeu seu rumo lá atrás
Ou que seguiu outro rumo por escolha
É por isso que chegam até nós
Num agora com cheiro de tempo dormido
Não sei o que segredam com o tempo...
São de um passado que moveu noutra direção
Mas que, não sei por que, nos ultrapassa
Eu queria saber de que matéria é feita
A sabedoria de silêncios que elas conspiram.
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8 comentários:
Hummmmmm, tem até paladar!
Bjs,
Cris Moreno
Pois é. E ando há anos grávido dessas coisas. Tô aqui pensando como é que vim parar nessa de blogueiro - sei sim!, cansei de estar sufocando tudo - e vou entregar à vida o que não me pertence.
Ei, Cris! Você deve ser muito bonita. Me manda uma foto pra eu ver teus olhos.( O Val vai ficar muito puto de ciume, mas o grilo é dele...)
Ei, Ademir!(rsrs)Eu não conheço o Val. Ele frequenta o Quinta, o Pedro Nelito, blogs que eu também visito sempre. Mas nunca nos falamos nos cometários. Apenas comentamos alguns assuntos isoladamente. Foi a primeira vez que falei com ele. Aqui, no seu blog.
Se você tivesse que indicar excelentes produtores de música, poemas, poesias, pesquisas,...quem você indicaria, de diferentes lugares do estado?.
Por exemplo, se uma instituição de Belém resolvesse promover um evento, agrupando essas pessoas, com essas produções, quem você colocaria nessa relação?
Eu não sou bonita(o tempo é implacável).Meus olhos são castanhos claros(dependendo da cor das lentes dos óculos).
Sou uma pessoa comum, também jornalista, e que visita esses diários na internet.
Bjs,
Cris Moreno
A minha idade? Você tem oito anos a mais. E sou de Leão. Então já viu. Não perca tempo(rsrsrs).
Bjs,
Cris Moreno
Noooossa, que gentileza de me dar o fora! Muito rimbaudiana! Par delicatesse je perdu ma vie. Mas não cheguemos a tanto, que a minha perdi há anos, como a vergonha. rsrs. Sorry, se pareceu assédio. é que coleciono olhares e quero capturar o seu. Portanto, sua delicada recusa foi indeferida. O do Val, no blog, é de quem está ouvindo o galo cantar mas não sabe onde (repare!) O da Capitu machadiana era de ressaca eheheh, Mona Lisa era míope como uma taturana! Eu me recuso a falar do meu, com olheiras enormes, de cachorro sãobernardo.
Mas veja, estou há tanto tempo no sertão que devo ter esquecido até como andar numa cidade cosmopolitana. Por isso, não saberia informar que entidade liga com autores desconhecidos, mesmo com essa qualidade que tento, aos poucos, demonstrar no universo fechado da arte oficial, burocrática.Me dá uma luz aí, quem sabe vira motivo para juntar a quadrilha... Não sei para quando. Júlio César é promotor, Jorge milita na CPT, Charles organiza invasões rurais, eu sou o batman numa gotham city real, doída e doida.
manda a foto
Entendi, mocinho-morcego. Qual é o seu e-mail?
Bjs,
Cris Moreno
Quaradouro, visita os blogs:
htpp://saudadeparisina.blogspot.com
htpp://mundopessoa.blogspot.com
Bjs,
Cris Moreno
Anote,por favor:
ademirbraz@hotmail.com
ademirbraz@gmail.com
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