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terça-feira, 17 de março de 2009

A criativa arte de espantar urubu

Li várias vezes a matéria no Correio do Tocantins, para me certificar de que era aquilo mesmo. Depois confirmei a parada em versão do Laércio Ribeiro, no Opinião. Em seguida, conversei com amigos sobre o assunto, e suas reações foram de igual espanto. “Você jura?”, indagou uma amiga. “Pela fé da mucura!”, respondi, enquanto um terceiro foi curto e grosso: “Tás com sacanagem...” Não, não era sacanagem. O negócio é o seguinte: a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) bolou um plano fenomenal para tentar salvar o lixão marabaense, que o Ministério Público Estadual condenou e quer porque quer fechá-lo por causa dos urubus que ameaçam, como incontroláveis kamikases (“vento divino”, em japonês), derrubar a força aérea da TAM. Na impossibilidade de executar o extermínio puro, simples e mais barato da urubuzada – crime ambiental e afronta grave à torcida do Flamengo -, a Semma quer seqüestrar os lixeiros alados e abandoná-los à própria sorte pelo menos a 100 quilômetros daqui, a pretexto de que, dessa distância, urubu nenhum acertaria o caminho de volta a Marabá e viveríamos todos felizes para sempre. Não bastasse a inconstitucionalidade implícita na pretensão de cercear aos animais o direito sagrado de ir e vir, no seu afã a secretaria ainda os chama de “aves de rapina”! Rapinar, rapinação, se o senhor não sabe, é roubo praticado com violência, e isso dito em relação aos urubus é injúria, calúnia e difamação. Só falta agora a Semma chamá-los de pretos, para incorrer na ofensa definitiva que é o crime inafiançável de preconceito racial... O projeto da secretaria possui desdobramentos significativos e ainda não explicados. Por exemplo, quanto custará aos cofres públicos esta remoção substitutiva do holocausto urubulino disfarçado ou presumido? Em razão da sua quantidade – centenas! – qual o preço per capita para tirar cada um daqui? Como é que vai ficar a cadeia alimentar, se são aquelas aves que devoram as carniças, os restos do consumo que estragam na mesa da burguesia e jamais chegarão à mesa dos famintos, mesmo aqueles que disputam, no lixão, as sobras justamente com os urubus? Uma questão inafastável são a forma e o destino dessa “exportação”. Para Eldorado dos Carajás, na PA-150, para o Repartimento (Transamazônica) ou para o Estado do Maranhão, nesse raio de 100 km, ou mais além, para Uruburetama, será preciso alocar inumeráveis carretões de boiadeiro ou vagões do trem da Vale com acomodações e alimentação adequada, respeitadas as regras ambientais. E quem vai nos garantir que essa ave do paraíso não acabará voltando ao berço maternal do lixão deixado por Tião Miranda, o inefável? Por fim, não seria mais barato construir um aterro sanitário de verdade fora da linha de vôo dos aviões que nos servem?

Um comentário:

Unknown disse...

Poeta, essa é pra morrer de sorrir. Saudades de vc.