Duas horas da manhã de sábado passado, uma ambulância de Eldorado dos Carajás, a cem quilômetros de distância desta cidade, cruza velozmente a VP do Cemitério da Saudade. Na pista vazia, nem precisa usar a sirene até alcançar o pátio interno do Hospital Municipal de Marabá.
O motorista de táxi, que faz ponto em frente ao hospital, diz que esta é a rotina diária de ambulâncias de municípios vizinhos e distantes, inclusive do Estado do Tocantins, em busca de atendimento médico para seus doentes.
Houve um tempo, quando Marabá integrava o Convênio Intermunicipal de Saúde do Araguaia-Tocantins (Cisat), criado em 1997/97 pelos médicos Geraldo Veloso, prefeito, e Silvino Santis, vereador, cada município que para cá mandava seus pacientes pagava ao final do mês 2% de seu Fundo de Participação do Município (FPM), a título de compensação. Era pouco, mas ajudava a custear medicamentos e a estrutura da saúde. Hoje, nem isso: Marabá carrega sozinho o ônus da prestação do serviço. E a conseqüência é a degradação da qualidade dessa assistência.
Sem alternativa imediata, fontes ligadas à saúde pública em Marabá dizem ser inevitável o agravamento da situação, a partir de 2012, com a possível criação de novos municípios, proposta levada à Assembléia Legislativa com pedido de formação de comissão para estudos de viabilidade municipal. É que entre as 21 novas unidades administrativas propostas, estão Brejo do Meio, o bairro de Morada Nova (que passará a se chamar Paraguatins), Santa Fé do Rio Preto e Capistrano de Abreu (que será chamado de Rio Preto dos Carajás), desmembrados de Marabá; São Sebastião, Cajazeiras e Cruzeiro do Sul, de Itupiranga; Maracajá, Vitória da Conquista de Carajás e Belo Monte, de Novo Repartimento; Bela Vista do Pará, de Dom Eliseu e outros, todos ou quase todos sob influência do pólo regional de Marabá.
“E tão logo sejam criados e eleitos seus administradores, todos vão preferir comprar ambulância a construir hospital e postos de saúde em seus municípios”, raciocina o taxista de plantão no Hospital Municipal.
Foi o desregramento na criação de municipalidades sem condições de sobreviver autonomamente que levou o constituinte a tornar mais dificultoso esse processo, inserindo na Constituição, pela EC 15 de 1996, a normativa de que a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios podem ser feitas por lei estadual, mas dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependendo de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei (CF, art. 18, § 4º).
Ocorre que até hoje não foi editada pelo Congresso Nacional a tal lei complementar, de sorte que a criação de municípios não tem amparo legal.
“Em decisões recentes, diz artigo da Revista Jus Vigilantibus (28.09.2009), tem o Supremo Tribunal Federal declarado a inconstitucionalidade das leis que criaram municípios sem o amparo da legislação infraconstitucional exigida pelo art. 18, §4º, da Carta Magna, sem, porém, decretar a nulidade da criação, em função da necessária segurança jurídica a ser mantida, tendo em vista que aludidos municípios se encontram instalados a um tempo significativo”.
Em relação apenas a municípios já instalados, vejam bem, em nome do princípio da segurança jurídica. Foi assim, por exemplo, o entendimento verificado na ADI 2.240/BA, quando foi alegada a inconstitucionalidade da Lei 7.619/00, do Estado da Bahia, que criou o Município de Luis Eduardo Magalhães. Cauteloso, o STF declarou a “inconstitucionalidade da lei estadual, sem pronúncia de sua nulidade” pelo prazo de 24 meses.
Para convalidar os municípios criados após 1996 e ameaçados de extinção pelas reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal, o Congresso Nacional aprovou e promulgou a Emenda Constitucional nº 57, de 18/12/2008, que acrescentou o art. 96 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determinando que “ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação.”
Assim, a criação de municípios, enquanto não editada a lei complementar exigida pelo art. 18, § 4º, da Constituição Federal, redundará em inconstitucionalidade, segundo a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal.
6 comentários:
Esta análise está correta. Prospecta um futuro sinistro e caótica para a saúde de Marabá. Faltou uma análise de contexto sobre a administração municipal. O Maurino teria condições de fazer esta mesma leitura? Que medidas faria para não arcar com todo o ônus? Será que os assessores destes não acordaram para a realidade. Se estes não trabalham tem que sair. Tem que tirar os secretários e assessores preguiçosos e colocar pessoas comprometidas. TEm muita gente apenas coçando, tipo o Nei Calandrino entre outros. Que decepção.
Não, ilustre leitor, a análise do governo e sua coadjuvante, a Câmara,vem desde o início de 2009. Atualmente, entendo que não há mais o que mais analisar - só a denunciar. E lamentar que a instância competente, o zelador do cunprimento das leis, não tome as providências necessárias para dar fim ao descalabro.
A saída, imagino, será elegermos em 2012 um prefeito digno e compromissado com Marabá, e uma Câmara independente, fiscalizadora, integrada por pessoas sérias e que não façam da política um meio de vida.
É o "povo governando", com a ajuda de um Legislativo "independente e que trabalha sempre a favor da comunidade"!
Tá rindo de quê?!
Ademir,
Você fala em câmara independente, fiscalizadora, integrada por pessoas sérias e honestas, estou entendendo com essa suas palavras que a atual câmara não oferece esses pré-requisitos.
Entre os dois candidatos que estão na disputa pela presidencia da atual câmara, vc indicaria o seu favorito?
Na Câmara, Gilvandro, essas qualidades estão disseminadas no entorno do plenário, entre os funcionários da Casa.
Para a presidência, ambos se igualam na serventia a Maurino Magalhães e, por isso, jamais será independente quem ocupar o cargo.
Por falar em Câmara, achei um primor a cusparada que a quase ex-vereadora Irismar deu no prato sujo do Maurino.
E achei delicioso o lançamento que ela fez de seu próprio nome para sucedê-lo.
É como sempre digo: em Marabá não existe nada que não possa ser piorado...
A olhar pelo aspecto infraestrutural, Marabá passa por um momento único do sua história. Porém, com a administração atual esse momento torna-se também único só que formanegativa. O prefeito (e sua prole) só anda de carrão enquanto que o povo sofre com sua incompetência administrativa.
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