sexta-feira, 20 de abril de 2007
A arte em grãos III: Augusto Cézar Bastos
Augusto Cézar Bastos nasceu em Itaguatins, Goiás, no começo do século XX. Em 1920, iniciou seus estudos em Marabá (PA), para onde a família migrou. Em 1928, vivendo em Belém, convive com intelectuais paraenses, entre os quais Bruno de Menezes, Campos Ribeiro, Jacques Flores, dedicando-se à boêmia e à poesia. Em 1933, abandona os estudos universitários e muda-se para São Paulo onde engaja-se como soldado, na esteira do movimento constitucionalista, mas logo abandona a farda, retornando à vida desregrada até 1938. Além de soldado, foi jornalista, dentista prático, vagabundo em Santos, agrimensor no Rio de janeiro. Em 1939 retorna à casa paterna em Marabá, entregando-se de vez ao alcoolismo e quase morrendo em conseqüência disso. Em 1964 voltou a Itaguatins, onde tornou-se funcionário público municipal.
“O que restou dos sonhos” é seu único livro publicado (50 páginas, 15 poesias, Goiânia, 1981), graças a um amigo que conseguiu reunir fragmentos da sua obra, quase toda perdida para sempre. Quando dessa publicação, patrocinada pelo governo estadual, Augusto Cezar Bastos tinha 60 anos. Ignoro se ainda vive.
Alucinação
Faz tanto frio, tanto,
e eu, doido a morrer de frio e espanto,
passo a correr pela cidade morta.
Paro diante de umas velhas casas.
Ouço o bater tétrico de asas
e o rangido soturno de uma porta.
Faz tanto frio, tanto,
e eu, doido a morrer de frio e espanto,
volto a correr pela cidade morta.
Eu e minha rua
Minha rua é quase feia
Tortuosa, esburacada,
Mas nenhuma é mais bonita
Nas noites de lua cheia.
Crianças brincam de roda
Cantando “três cavaleiros,
Todos três chapéu na mão”,
Vão levantar Terezinha
Que rolou, caiu no chão.
Tem buracos onde a água
Vai brincar de se esconder.
Nas calçadas o luar
Dorme até o amanhecer.
Com cantigas nas calçadas
Minha rua é como eu:
Quase alegre olhando a lua
E no luar encontrando
Um sonho que se perdeu.
Violino do Diabo
Não sinto mais o odor dos tempos refloridos
e as cascatas de luz não trazem mais alento
aos frangalhos que são os meus cinco sentidos
saturados que estão de todos os tormentos.
Vão longe as ilusões dos tempos idos.
Tenho no peito temporais violentos
e nos meus olhos trago refletidos
o pensamento atroz e a dor desses momentos.
Tenho noites sem fim, de sonhos povoadas
e ao ver o sol eu sinto tristemente
a certea cruel das frias alvoradas.
Meus nervos hoje são as cordas retesadas
de um violino que o diabo fez presente
a outro diabo que vive às gargalhadas.
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