quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
Desmatamento e conflito agrário
Ao financiar os grandes frigoríficos do mundo, o BNDES torna-se conivente com devastação amazônica e aquecimento global
Leandro Uchoas, do Rio de Janeiro (RJ)
Nos anos recentes, o BNDES concedeu financiamento para alguns dos maiores frigoríficos do mundo. De forma indireta, estava concedendo renda para empresas cuja matéria-prima era comprada de criminosos. Fazendas que desmatam ilegalmente a Amazônia, utilizam trabalho escravo, ou invadem áreas indígenas, ganharam dinheiro do banco. Nos últimos três anos, as cinco principais indústrias de pecuária do país receberam R$ 5,5 bilhões da instituição.
Nova política
Em julho, o BNDES lançou uma nova política de financiamento ao setor pecuário. As medidas regulam pecuaristas, frigoríficos e poder público. Porém, embora haja avanços, as diretrizes estão longe de ser suficientes. O banco cria prazos longos para o cumprimento da lei. A rastreabilidade de todo o gado só será exigida daqui a sete anos, em 2016. Soma-se a isso os pedidos de legalização fundiária e de licenciamento ambiental, postergados até julho do ano que vem.
Além do problema dos prazos – considerados tímidos até se comparados às declarações públicas do governo –, o BNDES não impõe, nas novas regras, limitações ao desmatamento. Entre os avanços, destaca-se a criação de linhas de crédito para aumento de produtividade, e recuperação de áreas degradadas. Além disso, fornecedores com área embargada, condenados por desmatamento, trabalho escravo, ou localizada em área indígena, não receberão mais financiamento.
Um mês antes da nova político banco ter sido lançada, a ONG Greenpeace divulgava o relatório “A farra do boi na Amazônia”. Em investigação de três anos, a entidade rastreou carne, couro e outros produtos bovinos na região. Detectou que marcas como Adidas, Carrefour, Honda e Nike compram matéria-prima de criminosos. E constatou o financiamento do BNDES a frigoríficos ligados a fazendas criminosas.
Contradições do governo
Interessado em dobrar a participação do país no mercado de carne, o governo pouco faz para inibir a prática. Três das principais corporações da indústria de pecuária (Bertin, JBS e Marfrig) tem o próprio governo como acionista. São empresas coniventes com a devastação da floresta. A pecuária ocupa, atualmente, quase 80% das áreas desmatadas da floresta. Especialmente devido à devastação, o Brasil é o quarto maior emissor de gases de efeito estufa no mundo. De cada oito hectares desmatados, no mundo, um se deve à pecuária brasileira.
A bancada ruralista do Congresso Nacional, com significativa penetração no governo, organiza uma ofensiva no Parlamento contra políticas de combate ao desmatamento. Em outra direção, o governo levará para Copenhague, na Dinamarca, na Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em dezembro, uma proposta considerada boa. Promete-se reduzir em 40% a emissão de gases de efeito estufa até 2020 (destruição de florestas tropicais são responsáveis por 20% de emissão). Para que a promessa seja cumprida, mudanças de rumo nas medidas do BNDES precisam tornar-se prioridade.
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