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segunda-feira, 16 de abril de 2007

CPT: impunidade mantém violência no campo

Os dados dos conflitos e violências de 2006 reafirmam que permanecem intocados os alicerces da concentração da propriedade, sua defesa como valor quase absoluto, a truculência dos que dela se apropriaram e, sobretudo, a impunidade. Os trabalhadores e trabalhadoras rurais continuam sendo reprimidos e sofrendo violências. Em 2006 houve um aumento de 176,92% das tentativas de assassinato em relação a 2005. Em 2006 registraram-se 72, enquanto no ano anterior foram 26. O número de prisões também sofreu um significativo aumento, de 261 trabalhadores presos em 2005 para 917 em 2006. Um crescimento de 251,34%. Houve também um crescimento de 2,63% no número de assassinatos. Em 2006, 39 pessoas foram assassinadas. Em 2005 foram 38. Registrou-se uma diminuição de -10,54% no número de mortos em conseqüência dos conflitos. Foram 64 em 2005, e 57 em 2006. Também caiu o número de ameaçados de morte - 266 em 2005, 207 em 2006, -22,18% - e de torturados - 33 em 2005, 30 em 2006, - 9,09%. Conflitos Em 2006 foram registradas 1.212 ocorrências de conflitos relacionados com a posse, uso, resistência e luta pela terra, que compreende os conflitos por terra, as ocupações e acampamentos. Ao todo estiveram envolvidas 140.650 famílias. É importante se destacar que quase 20% destas ocorrências envolveram comunidades e povos tradicionais, notadamente indígenas e quilombolas, além de outras comunidades. O número representa uma diminuição percentual de -7,82% em relação a 2005, quando foram registrados 1.304 conflitos. As ocorrências de conflitos por terra apresentaram diminuição de -2,06%, 761, em 2006; 777, em 2005. Já as ocupações apresentaram uma diminuição percentual de – 12,13% (384, em 2006, 437 em 2005). Ainda maior foi a diminuição dos acampamentos – 25,56% (67 acampamentos em 2006, 90 em 2005). Nestes conflitos por terra registrou-se o despejo judicial de 19.449 famílias e a expulsão pelo poder privado de 1.809. Estes números representam uma redução percentual de -24,08% em relação ao número de famílias despejadas em 2005, 25.618 famílias, e de -58,57% em relação às famílias expulsas, 4.366 em 2005. Os despejos judiciais não atingem somente ocupações novas, mas áreas ocupadas de longa data. Chamou a atenção em 2006 o despejo de toda uma comunidade quilombola no município de Vargem Grande, MA, a de São Malaquias. As famílias viviam na área há mais de 100 anos. O corpo de um morador que havia falecido no dia do despejo teve que ser levado para outra comunidade para ser velado, enquanto sua casa era destruída. Entre os casos de expulsão destaca-se o acontecido em Murici, AL, onde 29 famílias foram expulsas pela ação da conhecida família de políticos Calheiros. Os conflitos no campo – soma dos conflitos por terra, pela água, trabalhistas, em tempos de seca – chegaram a 1.657, em 2006. -11,91% que em 2005, 1881. A leitura destes números, relacionando-os com a população rural de cada estado ou região, dá uma outra visão. Onde se dá o maior número de ações de mobilização - ocupações e acampamentos - no Centro-Sul do País, aí o número de assentamentos é menor. Por outro lado, os índices de violência sofrida pelos trabalhadores são bem maiores nas regiões onde a ação dos movimentos é menos intensa, como na Amazônia. Com isso, fica patente que a violência no campo não pode ser creditada ao aumento da pressão dos movimentos do campo, mas continua diretamente vinculada à truculência histórica do latifúndio, travestido hoje de agronegócio. Conflitos trabalhistas A violência que acompanha o trabalho escravo e outros conflitos trabalhistas foi significativa em 2006. Três trabalhadores na situação de escravidão foram assassinados, enquanto que em 2005 não se registrou nenhum caso. 300% a mais. O número de trabalhadores libertados em 2006 foi -20,67% (foram libertados pela fiscalização do Ministério do Trabalho 3.633 trabalhadores, em 2005 foram 4.585) enquanto que o número de denúncias de trabalho escravo foi de -5,07% menor. 262 denúncias recebidas em 2006, 276 em 2005. Também caiu o número de trabalhadores nestas denúncias: 6.930 em 2006, contra 7.707 em 2005. Uma redução de –10,08%. Também aparecem com destaque situações de violência em outros conflitos trabalhistas. O número de trabalhadores superexplorados foi 96,12% maior (7.078 pessoas, em 2006; 3.609, no ano anterior), mesmo que os casos registrados de superexploração tenha sido de 2,83% (109) a mais do que em 2005 (106). Nos casos de superexploração do trabalho registrou-se um assassinato. O de um menino de 11 anos, filho de um vaqueiro que fora ameaçado pelo fazendeiro, ao tentar acertar as contas depois de mais de três anos de trabalho. Quanto ao desrespeito trabalhista, as ocorrências registradas foram -62,50% menores (27 em 2006; 72, em 2005). Em contrapartida o número de pessoas que sofreu o desrespeito foi 167,05% maior (932 pessoas, em 2006; 349, em 2005). Outro dado preocupante é o de mortos em acidentes de trabalho: 100% a mais, em 2006 (14), em relação a 2005 (7). O número de feridos nestes acidentes foi de 22 em 2006, contra 27 em 2005, - 18,52% . Impunidade A CPT há muitos anos vem repetindo que a violência no campo se mantém por causa da impunidade. De 1985 a 2006, registraram-se 1.104 ocorrências de conflitos com assassinato. Nestes conflitos morreram 1.464 trabalhadores. Destas ocorrências somente 85 foram levadas a julgamento. Foram condenados 71 executores e somente 19 mandantes. É preciso que a sociedade brasileira exija do poder Judiciário uma atuação mais rigorosa. Um exemplo de impunidade é o massacre de Eldorado dos Carajás, onde 16 sem-terra foram mortos, no dia 17 de abril de 1996. Mesmo condenados, o coronel Mário Colares Pantoja (228 anos de prisão) e o capitão José Maria Pereira (158 anos) conseguiram hábeas corpus e hoje aguardam julgamento de recurso em liberdade. Para lembrar a ação dos trabalhadores, em 2002 foi aprovada a lei que instituiu o 17 de abril como o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária.

3 comentários:

Yúdice Andrade disse...

Excelente trazer à baila dados estatísticos sobre a violência no campo, diretamente associada à incapacidade do Estado de responder a tão complexas demandas - e não porque o seja, simplesmente, mas porque opotou por sê-lo.
A propósito, também postei outro dia sobre o programa "Escrevendo a liberdade", do DEPEN, mas sob a perspectiva de fornecer, aos presos, uma expectativa de valorização como seres humanos.

Ademir Braz disse...

Caro Yúdice, seus comentários são sempre bem vindos. Deu-se, contudo, que não achei seus posto sobre a valorização dos presos.
Agradeço remet~e-lo outra vez.
Um abraço

Ademir Braz disse...

Caro Yúdice, seus comentários são sempre bem vindos. Deu-se, contudo, que não achei seus posto sobre a valorização dos presos.
Agradeço remete-lo outra vez.
Um abraço