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segunda-feira, 11 de junho de 2007

A arte em grãos - VII: Charles Trocate

Paraense de Castanhal, onde nasceu a 07.07.1977 à margem do rio Apeú, Charles Trocate faz 30 anos – 15 dos quais na militância do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em 2002 lançou em Marabá seu primeiro livro “Poemas de Barricada”. Antes, incursionara numa publicação coletiva que saiu do prelo com defeito e acabou sendo posta de lado. “A poesia de Charles Trocate cheira a rebelião e amor, tem gosto de revolta e indignação. Ela madruga nas ocupações, passeia nos contornos da rua de qualquer corrutela, caminha com nossos mártires pela eternidade da História, acalenta nossas mulheres, mães, irmãs, filhas, amantes, companheiras... e conspira contra a dor”, diz na apresentação Jorge Nery, então integrante da coordenação estadual do MST/PA, hoje secretário de Planejamento da administração petista Darci Lermen, em Parauapebas. No intróito do ainda inédito livro “Bernardo” – nome do seu filho, que faz 4 anos em 11 de julho, e no qual recorda as crianças dos acampamentos e assentamentos rurais -, a também militante do Movimento, Ayala Ferreira, expressa que: “Este livro vem de muito longe na história e, por isso mesmo, não tão fácil de percorrer os lugares que passou e conhecer amplamente o que indica. Não é fácil porque não se trata de idéias abstratas.” “Bernardo” é, de fato, um relato entranhado de amor aos companheiros, às crianças nascidas do lado de fora do arame farpado dos latifúndios, todos a viver debaixo da palha ou da lona preta à beira da estrada que às vezes leva a lugar nenhum. Dias difíceis (Para João Paulo Santos) Os dias estão difíceis e não há reparação nisso. Emoldurado no tempo dispenso a morte Cavo nos olhos da política a palavra desagradável. Enfrento com poesia a estupidez até expor O brilho dessa emoção diária - lutar. Quero a repartir entre nós este abraço fraterno A carne que brame em seu covil e nesta voz não remida desdizer a fome. Arrasto do mar a lírica e na noite condenso o grito suado na garganta. A fé, contudo, irrompe corpo e idéia. Manifesto à lei Para Diassis Soledade Nesses dias tão difíceis o que vale um homem e seu coração? É perigoso demais sonhar (diz a lei) mas para o trabalho nos roubam as mãos. O homem caminha até seu limite E não há riso, não há festa no olhar: só o rude o sol sobre a pele! O mais simples dos gestos Foi pisoteado pelo som da miséria Digo sem silêncio e com nojo das siglas uniformes - neoliberalismo, mercado, burguesia, guerra, governo, policia, juiz, burocrata, monopólio, presidente, senador, governador, deputado etc etc... Ah! Imperialismo, voto, eleição, democracia! A revolta terá meu nome! Repito como aprendi na infância A revolta terá meu nome! Cotidiano Para Lidenilson Escavo profundezas no coração do tempo. É quase horizonte meu gesto. Com ele tenho caminhado sem deixar a exaustão alojar-se onde mais humano sou Cavo no chão o assunto do amor; Com ele aprendi a residir na pele da noite com a bandeira da vida. Sim. É preciso caminhar: enfrentar o dragão que insulta o pão que ponho à mesa com o músculo da luta a genial invenção da felicidade Devastado Não se faz poema assim, com cisco no olho estaca no coração Estranhamente devastado pela dor. Não se vive assim! Não assisto meu tempo passar. Duelo no mínimo todo dia e no máximo amo! É assim? Ressôo A Elde Monteiro Ao pé da árvore coloco toda sujeição dos versos Não sei fragmentar-lhes os músculos Nem supor romantismo nas pétalas do dia. Alguém cortou essa árvore e sua política fez do assombro os móveis da sala ingovernada. Alguém mesmo me disse um dia: “A beleza está a ermo e sem aparência.” Ao pé da árvore deixei os livros e suas maturações E escuto um tom. Quanta festividade tem a pele do palhaço O estômago, os pés e a falência? Ao pé da árvore enterro os mortos que tremulam em meu peito. Suas ciências, porém, continuam atadas ao sol, morando neste endereço oblíquo. À meia-noite A Eli Que ciência tem a brincadeira da flor Em transformar-se em cor? Quem terá o coração férvido Quando esse estalo chegar? O mundo pela palavra te cheira A língua pela circunstância lambe o sol O que cinde a vida é esse segredo. Dei-me o coração dos fatos A rima faceira de tuas mãos... Voar é isso: cair de dentro do assunto do amor, o que se acumulou. Permitir o que vale e sobra e resulta da vida que reportamos depressa.

2 comentários:

JAILSON disse...

sou um admirador do trocate não pelos poemas mas pela pessoa corajosa determinada que que ele e. Jailson Silva Machado, aluno do campos rural de marabá, do curso tecnico em agrpecuaria.

Anônimo disse...

É muito bom ver compartilhado poemas de Trocate!
Parabéns pelo trabalho.

Abraço,

Jonathan Constantino